Casamento entre prefeito idoso e adolescente foi permitido por lei de 2019; entenda

Veículo: Carta Capital - SP
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Casamento infantil

Casamento infantil: segundo dados da ONG Girls not Brides, mais de 2,2 milhões de meninas são casadas no Brasil. Esse valor corresponde a 36% da população feminina menor de 18 anos

No início da semana, o casamento entre o prefeito de Araucária (PR), Hassan Hussein Dehaini, e uma adolescente de 16 anos reacendeu o debate sobre casamentos com menores de idade e a lei que permite enlace pueril. 

O casamento entre o homem de 65 anos e a menor aconteceu um dia após ela atingir a idade mínima permitida por lei para celebrar matrimônio. 

Em 2019, uma mudança no Código Civil permitiu o casamento de menores de 18 anos a partir da chama da “idade núbil”, ou seja, quando o menor atinge 16 anos. 

Ainda que muito discutido pela sociedade médica, psicóloga e antropológica, o Código considerou que aos 16 anos o jovem já teria aptidão psicológica tanto para consumar relações sexuais, quanto para se casar. 

No entanto, para proteger os adolescentes, a lei determina ser necessária a autorização dos responsáveis leis do menor. 

Anteriormente, a legislação admitia o casamento de adolescentes em casos de gravidez ou para evitar a imposição ou cumprimento de pena criminal por relações sexuais com menores de 14 anos. 

Isso porque uma lei penal previa a não responsabilização daqueles que “remediassem o mal” causado a crianças e adolescentes com o casamento. 

Apesar da lei penal já ter sido revogada, a previsão se mantinha no Código Civil. 

O casamento infantil ainda é uma realidade bastante presente na América Latina, principalmente no Brasil, País da região com maior índice de meninas com menos de 18 anos casadas ou vivendo em situação equivalente ao matrimônio. 

Segundo dados da ONG Girls not Brides, mais de 2,2 milhões de meninas são casadas no Brasil. O número corresponde a 36% da população feminina menor de 18 anos. 

Em números absolutos, o Brasil ocupa o 5º lugar no ranking de países com maior ocorrência de casamentos infantis no mundo. 

Uma pesquisa da ONG Plan International Brasil que abordou o casamento na infância e na adolescência no Brasil, apontou que o tema não é parte constitutivo das agendas e políticas públicas no País.

O documento revela que frequentemente as meninas são as únicas cuidadoras dos filhos e as principais responsáveis pelo trabalho doméstico; e os maridos são em média nove anos mais velhos do que elas.

Ainda que se tenha a percepção de que casamentos infantis aconteçam em maior proporção nas áreas rurais do País, o problema também é encontrado em grande número nas áreas urbanas, sendo a pobreza o maior fator de risco, mas também sendo uma questão preocupante na classe média brasileira.

A realidade, infelizmente, não abrange apenas casamentos infantis com conivência dos menores – mesmo que o termo, se tratando de indivíduos civilmente relativamente incapazes, possa ser amplamente discutido. 

Em diversos casos, os casamentos precoces são forçados – seja pelo cônjuge ou pela família do menor – já que a autorização necessária por lei não depende de autorização judicial ou de um monitoramento mais aprofundado sobre a situação.

Entre os fatores que levam ao casamento infantil estão o desejo, muitas vezes de um membro da família, de proteger a reputação de uma menina que engravidou; o desejo de controlar a sexualidade das meninas; a vontade de obter segurança; e o desejo dos maridos de se casar com meninas mais jovens, consideradas mais atraentes e de mais fácil controle.

O casamento precoce pode provocar limitações como perda da liberdade e da autonomia, física e econômica. Outros estudos ainda apontam que meninas em situação marital tendem a engravidar em menos de um ano e ter imediatamente outro filho depois do primeiro, criando um ciclo de pobreza e desigualdade estrutural, com repetição de padrões.

Um levantamento do Banco Mundial, divulgado em 2015, aponta que o número de matrículas de meninas no ensino secundário (parte do ensino fundamental e todo o ensino médio) e o coeficiente de emprego das mulheres são mais altos onde a idade legal para o casamento é de 18 anos ou mais.

A pandemia agravou ainda mais a situação das meninas que viviam em condições maritais. 

Com o fechamento das escolas, vínculos sociais e serviços, como os de assistência sociais, ficaram restritos para essas jovens, aumentando ainda mais os fatores de risco de casamentos infantis e abusos, baseados em violência e pressões financeiras. 

 

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