Uerj lança primeiro jogo digital sobre cidadania para adolescentes em situação de vulnerabilidade social

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Você tem 15 anos, mora em uma comunidade e tem uma decisão a fazer nas primeiras horas da manhã: acordar para ir à escola ou continuar dormindo. Essa e outras situações reais do cotidiano de jovens acontecem no game “Faz Teu Corre”, jogo para celular point & click lançado pelo Observatório de Políticas Públicas para Adolescência (Oppa) da Uerj no evento Corre Cultural 2.0, realizado no Circo Voador em dezembro de 2024.

O “Faz Teu Corre” é gratuito e já está disponível para download. Mais do que um jogo, é também uma ferramenta educativa que conecta jovens do Programa Trabalho Protegido na Adolescência (PTPA), destinado a adolescentes em situação de vulnerabilidade social, a reflexões importantes sobre cidadania, escolhas conscientes e seus impactos no futuro, conforme conta a coordenadora do Oppa, Tatiane Alves.

“O game é um projeto de extensão que nasce a partir de um cuidado do Observatório com o desenvolvimento de novas pedagogias mais alinhadas ao perfil desse jovem que, mesmo desfavorecido, está sintonizado às novas mídias, como as redes sociais e, de modo geral, à realidade virtualizada, como a ‘gamificação’ da vida”, explica Tatiane, que destaca a parceria da Uerj com a Fundação para Infância e Adolescência (FIA).

Primeiro jogo lançado junto ao PTPA, “Faz Teu Corre” ainda apresenta versão simplificada. Em sua primeira etapa apresenta como cenário a casa onde mora o adolescente, com oito desafios a serem cumpridos. De forma subliminar, o jogo transmite informações sobre noções de direitos, escolhas, consequências e responsabilidades. “O jogador se diverte porque o game é engraçado. Fala a língua do jovem, que pode criar seu próprio avatar e personalizá-lo. Há situações como levar o irmão à escola, fazer o dever de casa, o contato com a vizinhança, até mesmo uma infestação de ratos. Como lidar com esses desafios? Eles estão no dia a dia desses jovens e surgem de maneira lúdica no jogo”, detalha a coordenadora do Oppa.

A casa enquanto realidade social dos jovens

“Faz Teu Corre” foi planejado a partir de uma pesquisa realizada pela equipe do Oppa em um evento organizado pelo próprio Observatório no início de 2024. Mais de 200 adolescentes responderam um miniformulário relacionado ao universo dos games – desde o conhecimento dos jogos àquilo que, dentro de sua realidade, eles considerariam mais “gamificável”.

Temas como amizade e relacionamento afetivo foram oferecidos dentre as opções, além de moradia. Para a surpresa do Observatório, a casa foi o lugar escolhido para mostrar a rotina dos jovens que vivem em um cenário de muitos carecimentos em comunidades e favelas. “Não tínhamos expectativas de que essa seria a opção escolhida. Interpretamos como a própria realidade social desses adolescentes. Na casa onde esses meninos moram há muitos desafios: habitação, alimentação, cuidado com os irmãos, segurança, relações afetivas, entre outros”, pontua Tatiane.

Desde o lançamento do jogo, o Oppa já contabilizou mais de 500 acessos, considerando a necessidade de entrar no site, baixar o aplicativo e fazer um cadastro. Para a coordenadora do Observatório, há o interesse de que o game esteja presente em lojas de aplicativos de celular para as versões Android ou Apple. No entanto, para que isso aconteça, ainda há algumas etapas a serem cumpridas a partir do início do semestre.

“O desafio deste ano é buscar financiamentos necessários para aumentar o número de acessos ao game. Teremos oficinas em março com atividades experimentais, então receberemos feedbacks sobre o que pode melhorar e quais ajustes poderemos fazer, já que iniciaremos o roteiro da segunda etapa do jogo: o momento em que o jovem sai de casa para trabalhar. Temas como mobilidade urbana e segurança pública serão abordados. Haverá informações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) na linguagem do jovem, com suas gírias”, adianta a coordenadora.

Game estimula reflexões e valores

Para o antropólogo Ricardo Lima, coordenador de Estudos Aplicados à Cultura do Oppa, alguns jovens que frequentam o Observatório não têm plena dimensão da potência cultural das camadas populares na sociedade.

“Quero dar reconhecimento ao jovem vulnerável do valor que ele tem. Fazê-lo perceber todo o potencial que traz com ele. Existe uma crítica sobre os games como fatores de alienação dos jovens, que deixam de pensar em suas vidas para mergulhar no universo dos jogos. O ‘Faz Teu Corre’ oferece várias perspectivas sobre a atuação do jovem em seu cotidiano, ajudando-o a tomar decisões que surgem no ato de brincar. Na realidade, o jogo está transmitindo uma série de reflexões e valores para estimular o jovem a pensar”, diz Lima.

Com o intuito de dar continuidade a experiências como os jogos pedagógicos, o Oppa necessita de mais parcerias no futuro, sendo a Uerj a primeira universidade a desenvolver um game relacionado a políticas públicas e sociais voltadas para a juventude em situação de vulnerabilidade social.

“Temos uma perspectiva promissora de futuro, não só de pioneirismo. A Uerj tem essa pegada de se lançar, colaborar com o fortalecimento das políticas públicas e criar espaços de reflexão para esses jovens, garantindo novas oportunidades. Eles precisam ter os seus direitos garantidos, viver a passagem da sua adolescência para a fase adulta de forma respeitosa, vivenciando o lúdico, próprio dessa fase da vida. Com isso, teremos uma sociedade mais justa”, sintetiza a coordenadora.

 

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