A mídia não dá bola para políticas públicas
Por Geraldinho Vieira
Charge de Claudius
O poder é o mel mais saboroso para a imprensa. Os políticos e os partidos, os jogos de cena destes atores e também algumas de suas lutas verdadeiras não escapam ao jornalismo.
É verdade que o jornalismo e as empresas de comunicação também não escapam das tramas e dos sabores da política e do poder: de um lado, quando provam e gostam do veneno e se confundem com os partidos e os interesses jogando à lama a idéia de pluralidade; de outro, quando a preguiça criativa ou um tipo de indiferença elitista os fazem pensar que para “vigiar” a ética, a democracia, a justiça social e a sustentabilidade basta olhar o que acontece na Esplanada dos Ministérios, nos palácios.
Vôo de uma asa só: o jornalismo se delicia com as agruras dos políticos, mas não dá a menor bola para as políticas, e esta é uma observação que vai aparecendo nos estudos e a olho nu para quem lê críticamente o jornalismo.
Trago três exemplos construídos pela ANDI – Comunicação e Direitos, organização com a qual colaboramos (Claudius, o chargista, e eu) e que dedica-se à análise da performance do jornalismo em temas de relevância social e ambiental (todas elas disponíveis no site da ANDI).
No ano passado, este monitoramento revelou que a cobertura da imprensa (jornais) sobre o Código Florestal foi muito mais intensa no que diz respeito ao “ambiente político” (o calor das disputas no Congresso) do que sobre “a política ambiental” em questão (em segundo plano e quase sempre de forma fragmentada).
Já no início deste ano, ANDI e Instituto Patrícia Galvão lançaram substancial estudo “Imprensa e agenda dos direitos das mulheres”, abordando três aspectos-chaves: Mulher e Poder; Mulher e Trabalho; Violência contra a mulher.
De novo, entre virtudes e pecados da cobertura, quase nada sobre políticas públicas.
Há, por exemplo, muita individualização da história com casos de mulheres em postos de comandos e superação pessoal, mas quase nada sobre as políticas de inclusão (ou falta de..), novas formas de trabalho ou igualdade salarial.
Quando a questão é a violência, a mesma coisa: casos individuais (passionais ou brutais, sempre), mas nada sobre o fenômeno da violência ou os desafios do combate… apenas uma visão de “boletim de ocorrência”.
Em breve, um novo esforço de leitura crítica do jornalismo aparecerá em análise sobre como atua a imprensa no universo da “violência e juventude”. Pode apostar: de novo, será sobre as políticas públicas onde menos o jornalismo contribui para formar uma consciência ampliada.
Artigo publicado no Blog do Noblat.