Lei de Acesso à Informação entra em vigor
A Lei de Acesso à Informação (nº 12.527), que determina a divulgação de conteúdo dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário – bem como de estatais, fundações públicas e entidades privadas sem fins lucrativos que recebam recursos públicos –, entrou em vigor no dia 16 de maio, 180 dias após ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff.
A legislação representa avanço quanto ao estabelecimento do sistema de transparência passiva no país, conforme entrevista do ministro-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, ao jornal “O Estado de São Paulo” (13). A partir da lei, pretende-se que o acompanhamento das ações em nível da União, estados e municípios por parte do cidadão se torne muito mais efetivo do que é atualmente.
A partir desta data, os órgãos e instituições englobados pela legislação estão obrigados a disponibilizar em portal da internet, no mínimo, registro de despesas, assim como de repasses – ou quaisquer transferências de recursos financeiros –; informações sobre processos licitatórios, como editais e resultados, além de contratos celebrados pelo órgão/instituição; registro das competências e estruturas organizacionais, endereços e telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao público; dados gerais para o acompanhamento de projetos, ações e obras de órgãos e entidades; além de resposta a perguntas mais frequentes da sociedade.
Além da transparência ativa das entidades públicas, qualquer cidadão poderá requerer aos órgãos responsáveis as informações que deseja. A legislação não permite questionamentos sobre os motivos do pedido de acesso às informações e, no caso dos dados não serem divulgados, deverão ser apresentadas justificativas formais para o sigilo. A lei dispõe, ainda, que se os órgãos não possuírem as informações solicitadas devem indicar outro lugar da administração onde os dados podem ser encontrados.
Contudo, ainda existe bastante resistência, em particular por parte das estatais, quanto à divulgação das informações. Com a justificativa de que a revelação de certos dados compromete a atuação das empresas no mercado ou dá vantagem a competidores, Petrobrás, Banco do Brasil, Caixa e BNDES pressionaram o governo quanto às restrições que deverão constar do decreto de regulamentação da Lei de Acesso. Até o momento não há informação se a Petrobrás pretende divulgar a lista de patrocínios, o salário da direção da empresa, relatórios de viagens ou detalhes de contratos, entre outras informações relevantes.
Segundo a reportagem, o Banco do Brasil continuará disponibilizando os relatórios de viagens internacionais de dirigentes apenas no Diário Oficial da União – o que contraria a lei. Já a Caixa afirmou que só irá divulgar a lista de patrocínios realizados caso seja resguardada a “preservação de estratégia empresarial” do banco. O BNDES, por sua vez, ainda está em processo de adequação do site da internet para disponibilização dos dados.
A demora na promulgação de decreto que detalhará o funcionamento da nova legislação, ao que tudo indica, é também empecilho à praticidade da lei. A legislação determina prazo máximo de 20 dias para divulgação de informação, prorrogável por mais 10 dias. No entanto, ainda não existem parâmetros concretos para definir que informações são ou não confidenciais, dependendo do exame de cada órgão.
Também não está claro se serão requeridos documentos para a identificação de quem fizer o pedido de informação – “a identificação do requerente não pode conter exigências que inviabilizem a solicitação”, diz o texto. Do mesmo modo, os órgãos recursais – instâncias hierarquicamente superiores que devem apreciar os recursos de pedidos negados irão variar conforme decisão de cada Poder. No Executivo, por exemplo, será a Controladoria-Geral da União.
Outro ponto conflitante diz respeito à necessidade de regulamentações próprias em cada unidade da federação, em sintonia com o pacto federativo. Isto significa que cada estado se encontra em um nível desigual quanto à adequação à Lei de Acesso, conforme os mecanismos de transparência que já estavam em uso. Enquanto que em alguns casos ainda é preciso publicar a maioria das informações exigidas, em outros a questão reside no refinamento de mecanismos de busca por parte do cidadão no portal do estado e municípios.
Entre os princípios básicos da lei, que devem gerir o modo como a informação é disponibilizada, estão a “observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção”; “divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações”; “utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação”; “fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública” e “desenvolvimento do controle social da administração pública”.
Na verdade, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a Convenção da Organização das Nações Unidas contra a Corrupção, a Constituição Federal e diversas outras leis já tratavam do direito do cidadão de receber informações dos órgãos públicos. A Lei de Diretrizes Orçamentárias, por exemplo, há anos, autoriza o acesso de entidades não governamentais a diversos bancos de dados. A facilidade, porém, não é viabilizada, pois as senhas de acesso aos referidos cadastros são sistematicamente negadas pelas Pastas com respostas evasivas. Assim sendo, há o receio de que a implantação desta lei possa também patinar na burocracia.
Entre os temores do esforço acabar em pizza está também a possibilidade dos gestores classificarem os documentos como “secretos”, “ultrasecretos” ou “reservados’, o que na prática torna a informação inacessível. Ou mesmo, dizê-la inexistente ou indisponível. Assim, o Brasil entraria para a péssima estatística divulgada recentemente por estudo da Associated Press (AP) que mostra que mais da metade das leis de acesso à informação na América Latina não são cumpridas.
A situação dos países latino-americanos é semelhante à da Ásia e melhor do que a África, mas pior do que a Europa. Apenas 38% dos países na América Latina foram completamente sensíveis aos pedidos de informação, como parte do projeto que envolve o total de 105 países, contou a AP ao Centro Knight para o Jornalismo nas Américas. De 18 países latino-americanos que faziam parte do projeto da AP para testar leis de acesso à informação, apenas sete enviaram todos os registros solicitados dentro do prazo estipulado por lei.
Para o pesquisador de transparência da Universidade Nacional Autônoma do México, Ernesto Villanueva, com oito livros publicados na área, a lei é boa comparada com experiências anteriores. “O Brasil tem a oportunidade de não cometer os erros do México e de outros países e fincar bases na cultura do direito de acesso que não existe na região”, afirmou ao jornal o Globo.
Fonte: Contas Abertas