A experiência brasileira da primeira infância no Sistema Judiciário e o papel da Sociedade Civil

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Vídeo da sessão realizada no 14o Congresso da ONU sobre Prevenção ao Crime e Justiça Criminal está disponível em três idiomas

Progressos registrados no Brasil no que se refere ao ordenamento jurídico, às políticas públicas e à atuação do Poder Judiciário com relação à garantia dos direitos das crianças na primeira infância têm chamado a atenção da comunidade internacional.

Reconhecendo a relevância dessas iniciativas e seu potencial em inspirar transformações no contexto de outras nações, os organizadores do 14º Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção ao Crime e Justiça Criminal viabilizaram o compartilhamento de conhecimento a respeito do tema, por representantes do Poder Judiciário e especialistas.

A sessão paralela, denominada “Justiça começa na infância – A experiência brasileira da primeira infância no Sistema Judiciário e o papel da Sociedade Civil”, aconteceu no dia 07 de março de 2021, com acesso restrito aos participantes do congresso.

Agora, o vídeo completo do evento se encontra disponível ao público em geral, em três idiomas, via YouTube:

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Espanhol:

Inglês:

A iniciativa integra um conjunto de ações desenvolvido por meio de parceria entre a Rede Nacional Primeira Infância – RNPI e a ANDI – Comunicação e Direitos, em aliança estratégica com o Programa Prioridade Absoluta, do Instituto Alana. A Open Society Foundations apoia esta divulgação da experiência brasileira junto à comunidade internacional.

Justiça começa na infância

O webinário demonstrou a importância da articulação entre as entidades da sociedade civil e os diversos órgãos do Sistema de Justiça para a garantia dos direitos das crianças na primeira infância. Importantes avanços relativos ao processo decisório, à estrutura de atendimento e ao treinamento de pessoal vêm sendo registrados nos últimos anos.

Merece especial atenção, nesse contexto de construção intersetorial, a formulação do Pacto Nacional da Primeira Infância, coordenado desde junho de 2019 pelo Conselho Nacional de Justiça, instituição pública que tem como missão aperfeiçoar o trabalho do sistema judiciário brasileiro.

A sessão realizada no âmbito do Congresso da ONU reuniu os seguintes participantes:

  • Pedro Hartung, coordenador do Programa Prioridade Absoluta, do Instituto Alana e mediador dos debates.
  • André Godinho, Ouvidor Nacional de Justiça e Membro da Comissão Permanente de Sustentabilidade e Responsabilidade Social do Conselho Nacional de Justiça.
  • Miriam Pragita, Diretora Executiva da ANDI – Comunicação e Direitos e Secretária Executiva da Rede Nacional Primeira Infância (RNPI).
  • Nathalie Fragoso, Advogada e integrante do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu).

A primeira exposição coube a André Godinho, que detalhou os aspectos conceituais e a estrutura das atividades que integram o Pacto Nacional pela Primeira Infância, o qual conta hoje com 180 instituições signatárias, entre órgãos do Poder Público e entidades da sociedade civil. Nesse âmbito, destacou a realização de pesquisas sobre o teor das decisões judiciais que afetam a vida das crianças de 0 a 6 anos de idade e o desenvolvimento de cursos para a capacitação dos operadores do Sistema de Justiça frente à temática.

Além disso, expôs duas outras relevantes iniciativas do Conselho Nacional de Justiça. A primeira delas voltada à escuta de crianças e adolescentes que sofreram ou presenciaram violência – estes depoimentos devem necessariamente contar com assistência psicológica e protocolos específicos, evitando assim situações de revitimização. A segunda ação está relacionada à implementação de políticas públicas para a prevenção e o combate à violência contra a mulher. Em ambas as situações, Godinho acentuou a importância da parceria entre o Poder Judiciário e órgãos do Poder Executivo, como foi o caso do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Em seguida, Miriam Pragita apresentou as atividades de advocacy que a Rede Nacional Primeira Infância vem desenvolvendo desde sua criação, com foco no processo legislativo e nas políticas públicas, sempre em articulação com o Congresso Nacional e o Poder Executivo. Entre outros avanços, ressaltou a elaboração do Plano Nacional pela Primeira Infância, que delineia as diretrizes para os programas e políticas voltados a esse segmento da população, nas mais diversas áreas, para o período de 2021 a 2030.

Nesse sentido, enfatizou a importância de transformar a abordagem adultocêntrica que prevalece em nossa sociedade, inclusive entre os agentes do Estado: “É essencial escutar as crianças e trazê-las para o debate público de forma a reconhecê-las como sujeitos de direitos, com vozes a serem ouvidas – mesmo sendo menores de 6 anos. Elas têm seus sentimentos, suas emoções e seus pensamentos para compartilhar conosco. Todas as crianças precisam ser escutadas”.

Miriam Pragita também chamou a atenção para a aprovação, em 2016, do Marco Legal da Primeira Infância, normativa voltada especificamente à garantia dos direitos das crianças de 0 a 6 anos. Em sua opinião, a nova lei “fortaleceu também as condições de o Poder Judiciário incidir sobre esse contexto, quando demandado”.

Em seus comentários, o mediador Pedro Hartung reforçou este entendimento de que a promulgação do Marco Legal da Primeira Infância foi crucial para fomentar o debate no âmbito do Sistema de Justiça. “Não se tratam apenas de normas legais específicas para reforçar o que já existe no país, mas também sobre a necessidade de novas políticas, impulsionando mudanças profundas nas instituições – o que se reflete diretamente sobre os vários setores do Poder Judiciário”.

Em sua apresentação, Nathalie Fragoso, advogada e integrante do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu), compartilhou com o público internacional reflexões sobre a importância de a sociedade civil também acionar os instrumentos de litigância judicial, em busca de garantir os direitos da Primeira Infância. Nesse contexto, destacou o Habeas Corpus coletivo apresentado junto à Suprema Corte brasileira, que conseguiu assegurar o direito à prisão domiciliar a gestantes e mães de crianças até 12 anos que estiverem cumprindo prisão preventiva.

Segundo Nathalie, a decisão da corte, datada de 2018, deixou claro que a maternidade vulnerável deve ser protegida e não descartada ou interrompida: “Quando falamos da prisão de mulheres, estamos falando do que elas enfrentam em seu confinamento. Não se trata só da privação de liberdade, mas também da retirada do acesso a programas de saúde pré-natal, do difícil acesso ou acesso irregular aos cuidados relativos ao parto e puerpério, de condições irregulares ou precárias de higiene e autocuidado”. Sintetizando o cenário de desproteção prevalente nas unidades prisionais, a advogada destacou: “Estamos falando de um ambiente que não está preparado para receber crianças e, de fato, proporcionar as condições adequadas para que mulheres exerçam sua maternidade”.

Ao encerrar o debate, Pedro Hartung pontuou que inúmeros argumentos referentes à prevenção do crime sustentam a importância de o Sistema de Justiça dedicar especial atenção à primeira infância: “Vencedores do Prêmio Nobel de Economia nos deram evidências de que, quando investimos nas crianças e cuidamos delas, também estamos oferecendo à sociedade um novo vetor de desenvolvimento socioeconômico – além disso, evitamos diversos problemas sociais, entre os quais crimes”.

Nessa perspectiva, sublinha ele, quando oferecemos às pessoas os recursos e as ferramentas para que desenvolvam seu melhor potencial, permitimos que passem a experimentar suas vidas de maneiras diferentes daquela a que estavam submetidas devido a um contexto de desigualdade e exclusão.