Congresso Nacional aprova Política Nacional de Qualidade do Ar
O Projeto de Lei 3.027/2022, que institui a Política Nacional de Qualidade do Ar (PNQA), foi aprovado em março pelo Congresso Nacional e aguarda apenas a sanção presidencial para virar lei nacional. A proposta institui o “Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitorAr)” e estabelece como instrumentos para a qualidade do ar a definição de limites máximos de emissão atmosférica e seu inventário; a adoção de padrões de qualidade do ar e seu monitoramento; a instituição de incentivos fiscais; e a criação de planos setoriais de gestão da qualidade do ar e de controle da poluição por fontes de emissão, entre outros temas. São medidas que visam ampliar a preservação ambiental e assegurar a saúde pública.
Mais do que uma notícia relevante, trata-se de uma vitória, e ela pode ser atribuída a toda a sociedade civil. Alguns atores específicos, no entanto, merecem destaque – afinal, a aprovação do PL é o resultado de um trabalho contínuo cujo início data de oito anos atrás, e que incluiu participações em audiências públicas em ambas as casas legislativas, consolidação de conhecimento e desenvolvimento de estudos técnicos, como por exemplo a Plataforma de Qualidade do Ar e o estudo “Dimensionamento da Rede Básica de Monitoramento da Qualidade do Ar no Brasil – Cenários Iniciais”, do Instituto de Energia e Meio Ambiente.
Voltemos ao início para traçar uma linha do tempo dos principais acontecimentos.
Entre 2016 e 2017, o Instituto Clima e Sociedade definiu, entre suas estratégias, trabalhar a agenda do clima por meio da descarbonização do transporte público, o que culminou com a criação do portfólio de Mobilidade Urbana, que mais tarde mudaria de nome para Transporte. Para aproximar a população da discussão sobre descarbonização do transporte público, assunto técnico e complexo, a decisão foi atuar na temática da qualidade do ar e promover o debate da eletrificação da frota de ônibus no Brasil.
São Paulo foi o ponto de partida. O iCS identificou atores e stakeholders que transitavam no assunto, mesmo dissociados, muitas vezes, da agenda climáticas, e os esforços tiveram início. Na esteira desses encontros, a parceria com o então Instituto Saúde e Sustentabilidade (ISS), hoje Instituto Ar, começou a se fortalecer.
Em 2017, quando o iCS e seus donatários, como a Purpose, lançaram campanhas de comunicação sobre a qualidade do ar em São Paulo, enquanto a sociedade civil (em especial a ISS, o ICCT, o Instituto Alana e o IEMA) realizava incidência junto a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), com o intuito de aprovar a Lei Estadual dos Ônibus Limpos (16.802/18), que previa a substituição da frota do município de São Paulo – em 2018, o prefeito João Dória sancionou a regulamentação, que legisla sobre a eletrificação dos ônibus na capital.
A vitória nos levou a voos maiores, com o início da articulação nacional em prol da agenda de qualidade do ar. Nessa época, o iCS solicitou o apoio direto do ISS para a redação/elaboração de um Projeto de Lei que instituísse a Política Nacional da Qualidade do Ar – ele se tornaria o PL 10521/18 na Câmara dos Deputados. Enquanto isso, a atuação coletiva em São Paulo levou à formação da Rede Mobilidade e Clima.
Participação em audiências públicas
Já em 2019, o IEMA (Instituto de Energia e Meio Ambiente), o ISS e o ICCT (International Council on Clean Transportation) participaram de audiência pública sobre qualidade do ar na Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados, enquanto o Ministério Público Federal ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra resolução do Conama sobre qualidade do ar (ADI 6148). Este movimento teve apoio direto do ISS e do Instituto Alana como amicus curiae (instituições que participam de processos como amigos da corte, ou seja, aqueles que embasam/corroboram argumentos com dados e estudos), uma vez que a resolução indicou política de parâmetros de qualidade do ar, mas não indicou nem previsão de tempo e nem os instrumentos para alcançá-los.
Embora o STF, em 2022, não tenha aceitado a sua inconstitucionalidade, determinou ao Conama a definição de metas. Em caso de não cumprimento, o Brasil passaria a assumir, automaticamente, as metas da Organização Mundial de Saúde. Este tornou-se um importante pano de fundo para a Política Nacional de Qualidade do Ar.
Durante a elaboração do texto inicial do Projeto de Lei, o ISS, que liderou o processo (com envolvimentos do Instituto Alana, ICCT, entre outros), a partir das articulações e doações do iCS, também conversou com a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), para chegar a um consenso de medidas e oportunidades para a PNQA.
O advento da pandemia da Covid-19, em 2020, ajudou no surgimento da Coalizão RespirAR, criada a partir desta rede de atores da sociedade civil, organizada com apoio do iCS. Ela lançou um manifesto em defesa da retomada da agenda de qualidade do ar no debate público. As doenças respiratórias estavam, mais do que nunca, em evidência, assim como os efeitos da poluição atmosférica na saúde das pessoas. Fatos como esses marcaram a primeira audiência pública na Câmara dos Deputados para debater o PL 10521/18.
A luz vermelha de perigo para os debates qualidade do ar reacendeu com força em 2021, quando a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA) tentou postergar os prazos da nova fase do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) para a adoção de tecnologias mais limpas, prevista para começar em 2022. O Ministério Público Federal negou o pedido.
Nova audiência pública sobre qualidade do ar foi agendada para a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, quando a Coalizão RespirAR foi representada, com sustentação oral, por Hélio Wicher Neto, do ISS. Ainda naquele ano, o PL foi aprovado na primeira Comissão na Câmara dos Deputados.
Além do julgamento do STF em relação à ADI 6148, o ano de 2022 teve um momento-chave: a Câmara dos Deputados aprovou o PL 10521/18, sem a proposição da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) de restringir a meio urbano.
O caminho estava, enfim, aberto para que, em 2023, o PL do PNQA avançasse no Senado. Ao mesmo tempo, o CONAMA atualizou os padrões de qualidade do ar, seguindo a determinação do STF no ano anterior.
Depois de uma longa estrada, o Senado aprovou a Política Nacional de Qualidade do Ar no mês passado.
O que teve início com o transporte público virou algo muito maior, que envolve as queimadas da Amazônia e muitas outras fontes de poluição atmosférica. O trabalho está só começando.
Contexto
- Baixa implementação de políticas públicas para qualidade do ar:
- Apenas 13 dos 26 estados do país têm alguma estação automática de monitoramento do ar.
- Mais de 80% das 245 unidades do equipamento disponíveis no país estão concentradas no Sudeste.
- Menos da metade dos 49 municípios brasileiros com mais de 500 mil habitantes possuem estações de inspeção de poluentes no ar.
- Ausência de investimento público no monitoramento da qualidade e outros instrumentos de controle e gestão
- Vácuo normativo.
O que a Política Nacional de Qualidade do Ar traz de novo?
- Criação do Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitoAr), que será responsável por monitorar padrões de medição estabelecidos pelo CONAMA e por divulgar dados nacionais em tempo real, baseando-se em dados estaduais.
- Após sanção da proposta, levantamento das emissões de poluentes deve ser realizado em até 3 anos pelos entes subnacionais para estabelecer parâmetros regionais de poluição.
- Governo federal deverá elaborar levantamento nacional consolidado das emissões em até 1 ano após os levantamentos regionais.
- Prevê benefícios fiscais e financiamento para capacitação, pesquisa, desenvolvimento tecnológico e sistemas de gestão que reduzam emissões de poluentes.
- Fomento à implementação de programas como Pronar, Proconve, Promot, programas de sucateamento, reciclagem e renovação de frotas, e inspeção e manutenção de veículos.
- Emenda permite aos estados e municípios criarem controles de emissão para fontes móveis veiculares, incluindo restrições de circulação baseadas em níveis de emissão.
Fonte: Instituto Clima e Sociedade
Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.