Trabalho infantil cresce no Distrito Federal
De acordo com o Censo 2010, a população de 10 a 17 anos ocupadas no DF saltou de 22.830 para 29.618 crianças e adolescentes em 10 anos
Exploração sexual, tráfico de drogas e trabalho doméstico também são formas de trabalho infantil
Propostas como a campanha “É da Nossa Conta! Sem Trabalho Infantil e pelo Trabalho Adolescente Protegido” pretendem mobilizar a sociedade para o problema
No Brasil, há 3,4 milhões de crianças e adolescentes entre 10 e 17 anos em situação de trabalho, segundo dados do IBGE. Esse quadro já esteve mais crítico. O País chegou a ter 14 milhões de meninas e meninos trabalhando. Enquanto os dados nacionais apontam para uma redução, motivada por intensa discussão sobre o tema e a estruturação de políticas públicas na área, no Distrito Federal houve aumento em todas as faixas etárias.
De acordo com o Censo 2010, em uma década, o número de pessoas entre 10 a 17 anos em situação de trabalho na capital federal saltou de 22.830 para 29.618 indivíduos – o que representa um crescimento de 29,73%. Entre as crianças com 10 a 13 anos, a variação foi ainda maior: de 1.709 no ano 2000 para 4.776 em 2010 – o equivalente a 179,46% a mais.
Para o integrante do Fórum Distrital de Erradicação do Trabalho Infantil (Fórum Peti-DF) Coracy Coelho, a desigualdade, marca registrada da capital do País, e questões culturais que cercam o tema são as principais razões para o resultado negativo no Censo. “A fragilidade financeira da família repercute no trabalho infantil, devido à lógica equivocada de que a criança da periferia precisa trabalhar”.
Coracy aponta ainda a desarticulação de medidas como um grave problema a ser superado. “A gente não vê ações articuladas do Poder Público. Aqui as crianças estudam e trabalham. Atividades no contra-turno seriam alternativas, mas geralmente os espaços são precários”, aponta.
Uma das possibilidades seria priorizar a utilização dos Centros Olímpicos por crianças e adolescentes oriundos do trabalho infantil. Essas estruturas, localizadas em regiões administrativas do DF, oferecem atividades esportivas como futebol, natação e ginástica, para a comunidade. Atualmente as vagas são garantidas por sorteio. “A criança já vem de uma situação de vulnerabilidade, por vezes sendo negligenciada pela família. O governo precisa ser mais proativo e as escolas têm papel fundamental na tomada de iniciativas”, opina.
Brasil
Apesar do avanço em termos nacionais, o debate em torno da temática ainda é necessário. “O trabalho infantil mais visível foi erradicado. O trabalho de crianças em carvoarias e sisais, por exemplo, se existe, é pequeno e ligado ao trabalho escravo. Atualmente, o trabalho acontece na sua versão invisível: a exploração sexual, o tráfico de drogas e o trabalho doméstico”, diz a gerente da área de infância e adolescência da Fundação Telefônica Vivo, Patrícia Santin.
A professora da Universidade da Amazônica (Unama) Danila Cal, pesquisadora da temática, explica que alguns trabalhos são considerados abusivos a priori, seja para crianças seja para adultos. Isso acontece, por exemplo, quando são atividades que exigem muito do corpo ou que possuem longas jornadas de trabalho. Outras atividades muitas vezes não são consideradas atividade laboral e se tornam menos visíveis à sociedade, como é o caso do trabalho doméstico e do trabalho ilícito.
“A diminuição dos índices de trabalho infantil está relacionada a uma mudança, mesmo que não tenha sido total, de percepção sobre o problema no sentido de perceber a criança como sujeito de direitos, e o trabalho, passou a ser uma violação desses direitos”, afirma assistente social e doutoranda em Ciências Sociais da Universidade de Brasília, Márcia Guedes Vieira.
Mesmo com essa mudança de percepção, o trabalho doméstico, por exemplo, ainda é visto como uma “ajuda” às crianças e adolescentes trabalhadoras e às suas famílias. "O trabalho infantil doméstico acontece no lar, um espaço tido como de proteção, e é considerado um caminho honesto. O trabalho ilícito, por sua vez, é considerado uma escolha ruim", diz Danila Cal.
No caso da ocupação ilícita, como tráfico de drogas e exploração sexual, fatores como pobreza e falta de perspectivas não são considerados como causas. A exploração sexual, o tráfico de drogas e o trabalho doméstico estão na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (TIP) definida na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e promulgada no Brasil pelo Decreto no 3.597, de 12 de setembro de 2000.
Caminhos
Danila Cal explica que no enfrentamento ao trabalho infantil é preciso dialogar diretamente com os discursos que sustentam essas ocupações. "Problematizar com a sociedade, colocando argumentos, dialogando, mostra que somos nós que fazemos a cultura. Podemos modificar as formas de pensar e, assim, modificar as formas de agir", afirma.
A pesquisadora ainda lembra que, no caso do trabalho doméstico, é preciso haver políticas de retaguarda para garantir que as famílias de origem tenham condições de sustentar as crianças e que os adolescentes possam ser inseridos profissionalmente, por exemplo. No caso do trabalho ilícito o caminho seria semelhante: políticas públicas que garantam profissionalização, renda, educação, entre outros, e a desmistificação da ideia de que o tráfico de drogas ou a exploração sexual seriam escolhas de meninos e meninas.
Márcia Guedes avalia que há carência de políticas públicas voltadas para a questão cultural do trabalho infantil. “A visão da política voltada para esse tema é de que é um problema de renda especificamente”, conta. Assim como Danila, ela acrescenta que a questão cultural também tem que ser levada em conta, com campanhas informando a sociedade sobre os problemas que o trabalho infantil pode trazer para as crianças e também fazer um trabalho com a família.
É da nossa conta
Para mobilizar a sociedade em torno do enfrentamento ao trabalho infantil e esclarecer as condições para a contratação legal de adolescentes para o mercado de trabalho, foi lançada neste mês a campanha colaborativa nacional “É da Nossa Conta! Sem Trabalho Infantil e pelo Trabalho Adolescente Protegido”. A nova edição da campanha, iniciada em 2012, é realizada pela Fundação Telefônica Vivo, em parceria com o UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) e a OIT (Organização Internacional do Trabalho). A campanha é apoiada pela Rede ANDI Brasil.
Patrícia Santin, gerente da área de infância e adolescência da Fundação Telefônica Vivo, explica que um dos objetivos da iniciativa é desconstruir algumas questões culturais em torno do tema, como o discurso de que o trabalho é uma alternativa honesta à pobreza e que o envolvimento na exploração sexual e no tráfico são escolhas simplesmente. A campanha ainda tem como objetivo discutir o que nós, cidadãos, podemos fazer no dia-a-dia para combater o trabalho infantil. “Somos parte do problema, mas também somos parte da solução”, afirma.
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