Teresina tem 10 crianças aptas a adoção e quase 300 adotantes, mas crianças não têm o perfil procurado
De acordo com dados fornecidos pela 1ª Vara da Infância e Juventude de Teresina, a capital tem 298 pretendentes habilitados para adoção e apenas 10 crianças aptas a serem adotadas, quase 30 vezes mais adotantes do que meninos e meninas aguardando uma adoção.
Desse total, 51 são pretendentes à adoção solo, sendo 48 mulheres e três homens. Também há 10 casais homoafetivos (oito formados por pessoas do sexo masculino e dois pelo feminino) e os demais são casais heterossexuais.
Segundo a juíza titular da 1ª Vara da Infância da Juventude de Teresina, Maria Luiza de Moura Mello e Freitas, o perfil procurado pelos adotantes não coincide com as crianças aptas à adoção.
“O perfil dos pretendentes dificilmente bate com as crianças que temos disponibilizadas nos abrigos de Teresina. Embora tenhamos mais pretendentes do que crianças e adolescentes aptos a serem adotados, a maioria são crianças acima da idade preferida pelos adotantes, que é abaixo de três anos”, ela aponta.
Ela também explica que outros grupos, como irmãos, crianças com problemas de saúde, que tomam medicamentos e crianças com deficiência costumam ficar de fora dos perfis procurados.
Perfil das crianças e adolescentes
A 1ª Vara da Infância e da Juventude em Teresina também informa que, na capital, três meninos e sete meninas estão aptos à adoção. Desses, uma é uma criança de seis anos e os demais adolescentes entre 12 e 16 anos.
Um dos menores tem diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista. Os demais fazem acompanhamento em saúde e usam medicamentos de forma contínua.
Além deles, outras 14 crianças, com idades entre 30 dias e 18 meses de vida, já estão em processo de aproximação ou estágio de convivência na residência de casais habilitados.
“O estágio de convivência é muito importante e não deve ser apressado, pois é nele que ambos, adotantes e adotados, devem se conhecer. É nele que devem surgir as dificuldades e sondadas as possibilidades e os desafios que aquela adoção implica”, explicou a juíza.
Grupo de apoio ao acolhimento
A capital conta com grupos de apoio ao acolhimento solidário e à adoção, como é o caso do Centro de Reintegração Familiar e Incentivo à Adoção (Cria). O projeto social sem fins lucrativos surgiu há 13 anos para assistir crianças que não têm o convívio familiar.
A ONG possui iniciativas como o Programa Família Acolhedora, que promove a convivência familiar e comunitária dos menores afastados de suas famílias por medidas protetivas; o Projeto Fortalecendo Vínculos, para aqueles reintegrados às família de origem ou de acolhimento familiar; Projeto Escola de Famílias, que visa a prevenir ruptura dos vínculos familiares e comunitários; o Projeto Unir para Cuidar, que trabalha na prevenção do acolhimento institucional de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social; o Projeto Mudando Destinos, que busca garantir os direitos dos menores institucionalizados à convivência familiar; entre outras atividades.
Francimélia Nogueira, fundadora e coordenadora do Cria, conta que, atualmente, a instituição acolhe 30 famílias, com crianças entre 3 e 17 anos. Ela diz que a divergência entre o perfil procurado por adotantes e o das crianças aptas à adoção é, de fato, um dos problemas para que os menores encontrem um novo lar. Entretanto, ela aponta outro fator como o maior entrave.
“O perfil dos pretendentes é um dificultador, já que a maioria quer crianças pequenas, mas o grande nó para que as crianças permaneçam mais tempo nos abrigos é o tempo esperando a justiça definir a situação processual delas. Essas crianças e adolescentes acabam passando muito tempo fora da convivência familiar”, ela ressalta.
Experiência pessoal
Francimélia Nogueira conta que a iniciativa surgiu após ela passar pelo processo de adoção da sua filha mais nova, Ana Clara. A criança, na época com 1 ano e 10 meses, vivia em uma das instituições de acolhimento de Teresina.
“Para mim, foi algo que aconteceu. Na maioria das vezes, a adoção é planejada, os pais têm como se preparar. No meu caso, iniciei como madrinha afetiva. Ela veio passar o Natal conosco, muito carente de cuidados físicos e psicológicos. Nesse período, passamos a lutar por ela, para que ela não voltasse para o abrigo”, ela narra.
Apesar disso, ela diz que a família passou pelo sofrimento de ver a criança retornar ao abrigo até que o processo da adoção fosse finalizado.
“Mas deu tudo certo. Daí veio a motivação para ajudar outras pessoas e garantir a vida em família para as crianças que estão em abrigos”, comemora.
Ela ainda fala sobre os percalços da adaptação.
Adotar não é algo fácil. Criar filhos não é fácil e, sem romantizar, pela adoção é mais difícil ainda. A gente recebe como filho, ama e protege, mas não pode esquecer que a criança passou por histórias de abandono e maus-tratos. É preciso aprender a lidar com isso, enquanto pais, para ajudar o filho ou filha”, destacou.
Dados do Piauí
De acordo com o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dados mais recentes apontam que 38 crianças estão disponíveis para adoção no Piauí. Outras 47 estão em processo de adoção no estado.
Entretanto, a soma de pretendentes aptos no estado diverge dos dados fornecidos pelo TJ-PI. Enquanto o órgão estadual aponta 298 pretendentes habilitados somente na capital, o CNJ informa que, em todo o estado, são 128 pretendentes aptos.
Passos para a adoção
Quem tem interesse em adotar deve se dirigir à Vara da Infância e Juventude ou à Defensoria Pública da cidade para obter as informações.
São requisitos iniciais para adotar ter mais de 18 anos, independente do estado civil. É necessário apresentar os seguintes documentos: CPF, identidade do(s) pretendente(s), comprovante de residência, renda, atestado médico de sanidade física e mental, certidões negativas cível e criminal e indicar duas testemunhas que não sejam parentes.
Os interessados passam por uma análise dos documentos e os autos são encaminhados à equipe técnica do Juizado, formada por psicólogos e assistentes sociais. Além disso, os pretendentes são submetidos a entrevistas e visitas a suas residências, de forma que a equipe possa conhecer os motivos e as expectativas sobre a adoção.
Após esse processo, a equipe apresenta um relatório circunstanciado de avaliação social e psicológica para auxiliar na decisão do juiz.
O próximo passo é enviar o processo ao Ministério Público, que poderá requerer diligências caso entenda necessário. Podem ser realizadas audiências para oitiva da genitora ou dos genitores da criança e testemunhas.
Só então o processo segue para o juiz proferir uma sentença, seja ela procedente ou improcedente, para o pedido de adoção.