Crianças de até 5 anos podem ter perdido 25% da renda que teriam na vida adulta com a pandemia
As crianças pequenas acumularam um déficit cognitivo durante a pandemia que pode significar uma queda de 25% na renda que teriam na vida adulta. O impacto foi calculado pelo Banco Mundial e divulgado na manhã desta quinta-feira (16).
O relatório “Colapso e recuperação: como a pandemia de Covid-19 deteriorou o capital humano e o que fazer a respeito” aponta que as crianças de 0 a 5 anos são as que tiveram maiores perdas com a crise sanitária e podem sofrer a repercussão mais severa ao longo da vida.
O Banco Mundial calcula que, para a população de 6 a 14 anos, as perdas desse período podem representar uma queda de 10% de rendimento ao longo da vida.
“O risco é maior para as crianças menores porque o desenvolvimento humano é cumulativo. Elas tiveram perdas significativas no início da vida, que podem se arrastar por toda a trajetória escolar e culminar em piores oportunidades de trabalho”, disse Joana Silva, economista sênior do Banco Mundial e uma das autoras do estudo.
Segundo Joana, as crianças dessa faixa etária sofreram com perda crítica de investimentos em saúde e pré-escola, o que afetou o desenvolvimento cognitivo. Esse prejuízo se reflete de forma imediata, por exemplo, na dificuldade de aquisição de vocabulário e aprendizagem inicial em matemática e linguagem.
“As crianças mais velhas e os jovens também sofreram perdas que podem ter consequências para toda a vida, mas elas foram menos impactadas porque já tinham desenvolvido habilidades, acumulado algum conhecimento. Ainda que possam ter regredido em alguns deles”, explica a economista.
O estudo avalia que, com as escolas fechadas, as crianças não apenas deixaram de aprender como também esqueceram o que já haviam aprendido. O relatório calcula que, a cada 30 dias de fechamento das escolas, os alunos perderam cerca de 32 dias de aprendizagem.
BRASIL
A situação do Brasil é ainda mais crítica, já que foi um dos países com o maior tempo de escolas fechadas. Segundo o estudo, na média mundial as aulas presenciais foram suspensas por 5,9 meses —o que representa uma perda de aprendizagem de 6,2 meses. Já no Brasil, as escolas ficaram fechadas por 10 meses, em média.
“Esta é a dura realidade em muitos países, especialmente os de renda baixa, e é prenúncio da magnitude do desafio que temos pela frente”, destaca o relatório.
Joana Silva afirma que o objetivo do relatório é alertar os países para a importância e a urgência da implementação de políticas públicas voltadas para reverter as perdas que crianças e adolescentes sofreram durante a pandemia.
“As perdas individuais que essas crianças estão vivendo hoje vão influenciar o futuro da economia. Os países devem entender que precisam investir agora para evitar perdas coletivas de grande magnitude”, disse.
O estudo aponta algumas ações que podem reverter esse quadro, evitando que esse começo ruim cause maior perda de capital humano durante a vida dessas crianças. O documento recomenda, por exemplo, que as políticas públicas priorizem transferência de renda para famílias com crianças pequenas e programas parentais para incentivar maior estímulo cognitivo e socioemocional em casa.
Recomenda, ainda, campanhas de atualização da carteira de vacinação e suplementação nutricional, além da ampliação da cobertura da educação infantil.
Dados do Censo Escolar de 2022 mostram que a proporção de crianças matriculadas em pré-escola (de 4 a 5 anos) caiu durante a pandemia no Brasil. Em 2019, 92,9% da população dessa faixa etária estava na escola. Em 2022, a cobertura caiu para 91,5%.