Aprovação do PL 2630 é fundamental para regular plataformas e defender a democracia brasileira

Aprovação do PL 2630 é fundamental para regular plataformas e defender a democracia brasileira

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Com o crescente debate em torno das declarações e ações de Elon Musk, bilionário e proprietário da rede social X, a Coalizão Direitos na Rede e demais entidades que subscrevem a presente carta aberta expressam sua profunda indignação diante da postura de Musk e preocupação em relação aos desdobramentos desse caso. Manifestamos preocupação também com a criação, na Câmara dos Deputados, de um Grupo de Trabalho para tratar do Projeto de Lei 2630. Consideramos que o texto representa anos de debates e acordos possíveis entre diferentes setores. Somos uma coalizão dedicada à defesa dos direitos humanos e à promoção de um ambiente digital inclusivo e democrático, esperamos que o Brasil vote o PL e garanta mecanismos de transparência na operação das plataformas, fundamental para a defesa da democracia.

Os ataques de Elon Musk contra o presidente Lula e o ministro Alexandre de Moraes se somam a um quadro de questionamento da legitimidade das eleições brasileiras de 2022, falta de transparência generalizada, abusos na moderação de conteúdo e propagação de conteúdos problemáticos, como mensagens desinformativas e de discurso de ódio  por parte de Musk/X. Tudo isso mostra a necessidade de termos regras que estabeleçam procedimentos que garantam direitos e deveres na rede, tornando-a mais transparente e pautada pela responsabilidade social, caminho que o Brasil tem buscado trilhar desde a aprovação do Marco Civil da Internet.

O PL 2630 vem sendo debatido desde 2020, tendo sido objeto de dezenas de audiências e centenas de contribuições de especialistas na matéria. O amadurecimento brasileiro na discussão sobre regulação de plataformas precisa ser reconhecido para a aprovação de uma lei que esteja atenta às nossas especificidades e contribua para o respeito às instituições democráticas e a nossa soberania. O projeto cria obrigações de transparência sobre as plataformas, amplia hipóteses de responsabilização desses agentes, fixa direitos dos usuários para garantir a liberdade de expressão, estabelece sanções e instituições reguladoras participativas para a fiscalização e aplicação de punições na esfera administrativa, em complemento ao necessário papel do Judiciário. Infelizmente, a aprovação do PL tem sido bloqueada pelo intenso lobby das plataformas e pela resistência da extrema-direita, que usa a desculpa da liberdade de expressão para favorecer corporações e manter a liberdade de difundir conteúdos desinformativos e de ódio.

É fundamental ressaltar e destacar os esforços do relator Orlando Silva (PCdoB) na busca de um texto que dialogue com as diversas preocupações manifestadas pela sociedade civil. O parlamentar tem demonstrado um engajamento significativo na construção de regras que garantam direitos na rede, desde o Marco Civil da Internet, com reconhecida dedicação em ouvir as diversas vozes da sociedade e encontrar medidas adequadas para regular o ambiente digital de forma equilibrada e justa. Seu compromisso com a pauta, conhecimento do texto e capacidade de articulação são elementos que sustentam sua importância e nossa defesa de mantê-lo como relator do PL.

Regulação é caminho para soberania

O crescimento da extrema direita em diversos países é facilitado pela lógica de funcionamento das plataformas, seja por não adotarem critérios para a proliferação de mensagens pagas, por construírem bolhas algorítmicas ou por não efetivarem uma moderação responsável de conteúdos online. O caso de Musk não é diferente, uma vez que o dono da plataforma X tem sido denunciado há anos por ser apoiador de ideais conservadores e cooperar com regimes autocráticos ou autoritários, como ocorre em países como a Índia. Esse quadro é ainda mais preocupante porque teremos, em 2024, dezenas de eleições em todo o mundo que sofrem com os efeitos da plataformização desregulada sobre o debate público. É preciso enfrentar um cenário em que as plataformas deixam de implementar medidas necessárias para proteger processos democráticos contra a desinformação, o discurso de ódio e outros problemas, ao passo que seguem lucrando com eles.

É inegável que as declarações de Musk, sugerindo uma disposição de desrespeitar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), representem um ataque direto ao Estado Democrático de Direito e à independência do Judiciário. Essa atitude não apenas compromete a integridade do sistema democrático brasileiro, mas também evidencia uma preocupante interferência estrangeira nos assuntos internos do país, minando sua soberania. A preocupação com a soberania digital se estende também às infraestruturas de conectividade, especialmente em regiões tão estratégicas como a Amazônia. Depender unicamente da Starlink de Elon Musk para garantir a conectividade nessas áreas pode criar uma vulnerabilidade significativa, sujeitando a região a interferências externas adversas ao interesse público, e a um abuso de poder econômico sobre uma área tão fundamental para o país.

Atualmente, cinco grandes plataformas digitais controlam a circulação de conteúdos na Internet e, consequentemente, nos espaços de debate e participação online. O desdém da plataforma X com o ordenamento jurídico brasileiro é mais um sinal da crise de equidade global associada às empresas de Big Tech e sedimenta a hipótese de que estas se importam apenas com os países do Norte Global. Esses mesmos países atuam, inclusive, de maneira mais inicisiva por meio de regulações como o DSA e o DMA na Europa e por medidas de autoridades regulatórias como o Federal Trade Commission (FTC) dos Estados Unidos. O atendimento a ordens judiciais e observância às normas locais devem ser feitos em todos os países do mundo.

Os acontecimentos destacados na presente carta demonstram a importância de avançar na construção de uma regulação para plataformas digitais no Brasil e a sua centralidade na manutenção da democracia. Estabelecer parâmetros de transparência e do devido processo constitui, portanto, passo fundamental para garantirmos um ecossistema digital confiável, atento à integridade da informação, num contexto de extrema digitalização, inclusive, dos nossos processos democráticos.

Por fim, além de avançar na regulação das plataformas digitais, o Brasil precisa discutir com a população e efetivar políticas públicas capazes de promover sua soberania digital, a exemplo da manutenção de infraestruturas públicas para guarda de dados e de promoção de plataformas transparentes que funcionem para atender as necessidades locais e com vistas à promoção de direitos. O modelo atual das plataformas, a maior parte estadunidense, é voltado essencialmente à garantia de lucros, por isso o desenvolvimento de todo um mecanismo de captura de atenção e produção de audiência que é trocada por publicidade. Se não quisermos que esse modelo seja o único e paute a internet, precisamos construir alternativas.

Democracia e soberania são palavras que expressam enormes desafios para o Brasil e diversos outros países no momento atual. Precisamos dar passos para a garantia desses dois princípios fundamentais e a aprovação do PL 2630 é um deles. Regulação já!

Assine a carta!

 

Fonte: FNDC

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