Níveis de competência socioemocional são menores em alunos adolescentes, diz estudo internacional que inclui Sobral

Veículo: Diário do Nordeste - CE
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OCDE divulga resultados de uma pesquisa sobre competências socioemocionais que pela 1ª vez incluiu alunos de uma cidade brasileira: Sobral, no Ceará

Níveis de competência socioemocional
Foto: Prefeitura de Sobral/ Divulgação

Um estudo internacional da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre competências socioemocionais, feito com estudantes entre 10 e 15 anos, incluiu pela primeira vez a análise da realidade brasileira. Essa investigação ocorreu em Sobral, cidade na Região Norte do Ceará. Alunos do município foram inseridos na pesquisa que envolveu estudantes de 16 países. Os resultados, divulgados nesta sexta-feira (26), evidenciam que, de modo geral, alunos mais jovens têm níveis maiores de competência socioemocional do que os mais velhos, ou seja, à medida que crescem, os estudantes “recuam” no progresso das competências socioemocionais.

Os achados foram apresentados na Bulgária, pela manhã e à tarde no Brasil, na Bett Brasil 2024, maior evento de inovação e tecnologia para Educação na América Latina, que ocorreu em São Paulo. Segundo o estudo, em geral, os estudantes mais jovens, de 10 anos, demonstram maior progresso em competências como confiança, determinação, assertividade e otimismo em comparação com alunos de 15 anos. O contrário ocorreu na competência de empatia e tolerância. 

O levantamento foi feito a partir de autorrelato dos estudantes que responderam questões padronizadas em todos os territórios participantes. No Brasil, a pesquisa da OCDE foi implementada em Sobral em parceria com o Instituto Ayrton Senna.

A gerente de pesquisas e membro do eduLab21 do Instituto Ayrton Senna, Karen Teixeira, explica que ao falar de competências socioemocionais estamos tratando de “características individuais que se manifestam em padrões consistentes de como as pessoas agem, pensam, sentem, se comportam”. Essas competências, acrescenta ela, surgem de uma interação entre fatores com predisposições biológicas, como aspectos contextuais e sociais. “Então, esses fatores interagem, a história de vida interage, para formar as competências”, completa.

O estudo avaliou 15 competências socioemocionais divididas em cinco macrocompetência, são elas:

  • Desempenho de tarefas: competência de autocontrole, responsabilidade, persistência e determinação.
  • Regulação emocional: competência de tolerância ao estresse, otimismo e controle emocional;
  • Colaboração: competência de empatia e confiança;
  • Abertura ao novo: competência de tolerância; curiosidade e criatividade;
  • Engajamento com os outros: competência de  iniciativa social, assertividade e entusiasmo.

No caso específico de Sobral, estudantes com 10 anos relataram níveis mais baixos de empatia e tolerância do que os alunos de 15 anos. Em paralelo, as diferenças em termos de assertividade e confiança no município foram maiores do que a média entre os demais locais pesquisados, enquanto as diferenças de otimismo, entusiasmo, responsabilidade e criatividade foram menores do que a média.

“Os estudantes de 10 anos de idade relataram tem competências mais desenvolvidas do que dos de 15 anos, exceto para tolerância e empatia. É como se houvesse uma queda nos nível da competência de 10 anos até a amostra de 15 anos. E isso basicamente já é um pouco esperado na literatura”Karen Teixeira, gerente de pesquisas e membro do eduLab21 do Instituto Ayrton Senna.

Ela explica que tal cenário pode ser atribuído ao fato de os estudantes de 10 anos estarem, por exemplo, “naquela etapa que tem apenas um professor, polivalente, tem uma relação mais próxima com esse professor, passam mais tempo. Já os de 15 anos começaram entrar numa outra dinâmica, com mais componentes curriculares, mais professores, estão passando pelas transformações da adolescência, desenvolvimento da identidade, muitas mudanças físicas, sociais e elas impactam nos níveis desenvolvimento sócio emocional”.

Diante das evidências, Karen pondera que como tal resultado, em algum grau, “já é esperado” é preciso destacar “como as redes de ensino podem atuar para poder apoiar melhor essa faixa etária”.

As evidências foram apresentadas no painel “Lançamento de relatório da OCDE: como as avaliações socioemocionais podem apoiar políticas educacionais?”, que teve a participação da gerente de pesquisas e membro do eduLab21 do Instituto Ayrton Senna, Karen Teixeira; do secretário da Educação de Sobral, Herbert Lima, e a moderação do jornalista Antônio Gois, um dos fundadores da Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca).

Como a pesquisa foi feita?

A pesquisa é um dos primeiros estudos internacionais em larga escala sobre competências socioemocionais no mundo.  Com a participação inédita do Brasil em um estudo da OCDE sobre o assunto, estudantes brasileiros, e mais especificamente cearenses, foram investigados junto a alunos de outros 16 países, como Colômbia, Chile, Itália, Japão, Finlândia e Bulgária.

No Brasil, o estudo em Sobral foi feito em 2023, com mais de 4.500 participantes, entre estudantes de 10 e 15 anos, professores, diretores escolares e pais/responsáveis.

Na faixa etária dos 10 anos, segundo o Instituto Ayrton Senna, integraram o estudo  2.208 estudantes, 219 professores, todos os 55 diretores, e 1.032 pais ou responsáveis. Já entre os alunos com 15 anos, participaram 2.343, 287 professores, todos os 25 diretores, e 989 pais ou responsáveis.

O que deve ser feito com os resultados?

O secretário de Educação de Sobral, Hebert Lima Vasconcelos, explicou, durante apresentação no evento, que, de maneira diferente dos demais indicadores educacionais, o desenvolvimento das competências socioemocionais não depende de um índice específico ou de um patamar, pois esse é um processo permanente, que vai atravessar desde a educação infantil, anos iniciais, anos finais.

“O que há são instrumentos de monitoramento para diagnosticar e avaliar qual é o impacto, quais são as competências em determinado recorte, seja de idade, seja de série, ou seja por bairro”, acrescentou.

O gestor disse ainda, em entrevista ao Diário do Nordeste, que “à luz desses resultados, eu preciso permanentemente manter formação continuada dos gestores, promover momento de sensibilização com as famílias, então, levar para a comunidade escolar esses indicadores”, aponta.

Ela explica que no município outra atuação que contribui para o desenvolvimento das competências socioemocionais é o trabalho dos psicólogos escolares. Segundo Herbert, hoje, na rede que tem 87 unidades escolares, sendo 31 centros de educação infantil e 57 escolas, há 43 psicólogos/orientadores educacionais. “Conseguimos fazer uma intercalação de duas ou três vezes por semana um psicólogo em cada escola e conseguimos fazer a cobertura de todas as escolas trabalhando as questões socioemocionais”, completa.

Diante dos dados, Karen Teixeira esclareceu que a criação de políticas públicas com base nas análises é o caminho mais importante. Segundo ela,  é preciso “entender quais são os principais desafios daquela rede, qual o nível atual das competências daqueles estudantes, para que a política pública leve em consideração o contexto, esteja alinhada e consiga desdobrar em ações de formação, no currículo e que essas avaliações socioemocionais não sejam aplicadas somente no início para elaboração de uma política pública, mas que elas sigam e sejam aplicadas de forma sistematizada até que haja um acompanhamento”.

 

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