Mudanças climáticas afetam acesso à escola de 1,17 milhão de estudantes no Brasil
As mudanças climáticas interromperam as aulas para 1,17 milhão de estudantes no Brasil, em 2024, dos quais pelo menos 400 mil vivem na Amazônia brasileira, peruana e colombiana, por conta da seca severa que tornou inavegáveis os rios, impedindo que alunos, professores e suprimentos chegassem aos locais. A informação é do especialista em Programa-Clima Meio Ambiente e RDR do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Danilo Moura, durante audiência pública na Comissão de Educação (CE) da Câmara dos Deputados, na última quarta-feira, 18.
A Comissão debateu os dados sobre os impactos climáticos no ambiente escolar e a climatização das escolas no País. Segundo a presidente do colegiado, deputada Sâmia Bonfim (Psol-SP), as informações servirão de base para indicações e sugestões aos gestores públicos para encaminharem a adaptação das escolas para a nova realidade do clima, que vem piorando a cada ano.
Conforme Danilo Moura, do Unicef, as enchentes no Rio Grande do Sul e a seca severa na Amazônia foram os principais eventos climáticos que interromperam as aulas nas escolas do Brasil, por determinado tempo, ano passado. No caso da seca, os estudantes no Amazonas, por exemplo, ficaram pelo menos um mês, em alguns casos mais tempo, longe das escolas.
“As secas têm um impacto de longo prazo, têm um impacto prolongado que, às vezes, tem menos a ver com o fechamento das escolas e mais com a frequência dos estudantes, a matrícula, os resultados de aprendizagem. A seca tem essa característica de ter impactos de longo prazo no rendimento escolar mais do que no fechamento de escola”, explicou o representante do Unicef.
Em todo o mundo, foram 240 milhões de crianças que perderam aula por conta de eventos climáticos, de acordo com Moura. “Quando a gente olha para os impactos, um impacto global que nos chama a atenção é que, a principal causa para o fechamento de escolas, no ano passado, na verdade, foram as ondas de calor, globalmente. E esse é um dado que a gente não tem aqui no Brasil, por exemplo”, explicou o representante do Unicef.
No Rio Grande do Sul, além das escolas terem sido afetadas pela subida das águas durante as chuvas, as aulas foram suspensas também porque muitas delas foram usadas como equipamentos de socorro, servindo de abrigo aos moradores desalojados e acabaram passando mais tempo fechadas.
Moura também relembrou estudos que apontam como a elevação da temperatura para além de 32ºC impacta inclusive o rendimento escolar, além dos impactos secundários, como poluição do ar causada por queimadas, aumento de prevalência de doenças, como as respiratórias, diarreicas e as transmitidas por vetores como dengue, Chikungunya e zica.
Ilhas de calor e climatização
O representante do MapBiomas, Júlio Pedrassoli, lembrou os dados do estudo realizado em parceria com o Instituto Alana com as escolas de ensino infantil e fundamental, divulgado em fevereiro deste ano. A pesquisa apontou a proporção de escolas por capital localizadas em zonas de calor.
As capitais da Região Norte concentram a maior proporção de escolas que excedem 1ºC em relação à média do seu perímetro urbano, com Manaus na liderança (97%), seguida de Macapá (93%), Palmas (91,5%) e Porto Velho (91,4%). Na outra ponta, Belém é a capital com menos escolas em zonas de calor, 33,2%, a última do ranking.
O Censo Escolar 2022 do Instituto Nacional Anísio Teixeira (Inep), órgão do Ministério da Educação, mostra que 70% das escolas no Brasil não possuem climatização. Na avaliação do representante do Unicef, Danilo Moura, não adianta propor uma série de ações de adaptação se as pessoas continuarem aumentando o aquecimento global, causador das mudanças climáticas.
“Não existe nenhuma medida de adaptação que seja suficiente, se a gente não parar de cavar o fundo do poço”, ressaltou.
Propostas de solução
Durante a audiência foram apresentadas algumas propostas para melhorar o quadro de vulnerabilidade climática das escolas, que vão além de instalar aparelhos de ar-condicionado, mas impõem mudança da arquitetura das escolas, que saiam da versão “caixote” e passem a adotar um perfil bioclimático, termo adotado por Carlos Príncipe, do Ministério de Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
A especialista em Infâncias e Natureza do Instituto Alana, Maria Isabel Amando de Barros, informou que a instituição vai divulgar um relatório com propostas práticas para melhorar a regulação térmica das escolas, para que se tornem estruturas mais saudáveis, de educação e educadores mais interessantes para a comunidade escolar. “Escolas onde as crianças possam ver a natureza como aliada e não como ameaça”, reiterou.
Dentre as sugestões estão a adoção de telhado verde, parede verde, cortinas verdes, ilhas de frescor ou miniflorestas, que seriam pequenos maciços de vegetação dentro das escolas. Ou, ainda, o túnel vivo, iluminação e ventilação natural, estratégias que possam repensar as plantas arquitetônicas com novas técnicas construtivas, aliadas com a natureza.
Do Unicef, as propostas de soluções também passam pela mudança na infraestrutura das escolas, mas chama os gestores a pensarem em estratégias e protocolos de como manter o processo educacional em funcionamento, diante das emergências, procurando alternativas que evitem usar as escolas como abrigos, por exemplo.
Além disso, as mudanças climáticas também requerem novos procedimentos e rotinas dentro das escolas, como definir até a hora de atividades ao ar livre e que tipo de atividade, principalmente em locais de muito calor. Não menos importante, reitera Danilo Moura, é a promoção da educação socioambiental e envolver toda a comunidade escolar, para que de fato formem os estudantes para entenderem e terem uma relação diferente com o clima e com o meio ambiente.
Segundo a coordenadora-Geral de Educação Ambiental para a Diversidade e Sustentabilidade do Ministério da Educação, Viviane Vazzi Pedro, a pasta vem retomando a questão da educação ambiental nas escolas, que foi retirada do currículo no governo Bolsonaro (2019-2022) e hoje está presente em 67,3% das unidades habitacionais do País. No início dos anos 2000, segundo ela, superava os 90%.
Para saber mais sobre o direitos das crianças, conheça a newsletter Infância na Mídia.