Educadores defendem inclusão de competências socioemocionais na rotina escolar

Veículo: Agência Brasil - BR
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Responsabilidade, amizade, colaboração e solidariedade são qualidades que conhecemos do dia a dia, embora alguns de nós não saibamos como praticá-las. Pesquisadores brasileiros e estrangeiros querem que essas competências sejam “ensinadas” na escola, conjuntamente com português, matemática e demais disciplinas.

“Há pesquisas que mostram que as competências emocionais são mais importantes que o próprio aprendizado escolar para os resultados que a pessoa alcança ao longo da vida”, revela Tatiana Filgueiras, diretora do edulab21, projeto do Instituto Ayrton Senna que estuda formas inovadoras de educação para o século XXI.

As chamadas competências socioemocionais foram tema de debate realizado nesta semana em Fortaleza que reuniu pesquisadores, professores, gestores e secretários de Educação do Ceará e de outros estados para partilharem experiências e conhecimentos sobre o ensino dessas habilidades em sala de aula.

No Brasil, o Ceará integrou o desenvolvimento das competências emocionais à rotina escolar em 2012. A experiência ocorre em 160 das 700 unidades de educação. “Nós entendemos a importância desse aspecto porque o aluno é um sujeito individual. É preciso entendê-lo, respeitá-lo, saber seus pontos fracos e fortes para, a partir daí, ter melhores resultados no desempenho escolar”, defende o secretário da Educação do estado, Idilvan Alencar.

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) está concluindo uma avaliação da experiência cearense com competências emocionais nas escolas estaduais de ensino médio. Os resultados preliminares demonstram que os alunos tiveram bons desempenhos considerando somente um ano letivo, Além disso, estudantes fora da faixa etária indicada para o ano que cursam (mais suscetíveis a abandonar a escola) tiveram melhora na aprendizagem de disciplinas tradicionais.

Expansão

A ideia de incluir competências socioemocionais entre as disciplinas escolares faz parte da versão final da Base Nacional Comum Curricular, que será usada em todo o país. Atualmente, além do Ceará, apenas Rio de Janeiro e Espírito Santo aplicam essas competências no dia a dia dos estudantes.

Segundo Tatiana, em uma pesquisa realizada pelo Instituto Ayrton Senna em 2011, 79% de um universo de 3,7 mil diretores e professores disseram que é papel da escola desenvolver competências emocionais. Para ela, os impactos de que tratam a pesquisa do BID podem ser traduzidos na redução de conflitos entre alunos, com destaque para os episódios de bullying.

“Não é só papel da família desenvolver competências emocionais, porque a escola precisa compensar pelas desigualdades e precisamos dar chance para todo mundo ter as mesmas oportunidades e condições”, explica a diretora do edulab21.

Vida adulta

A falta de habilidades socioemocionais pode refletir-se na vida profissional e social dos adultos. O pesquisador Oliver John, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, cita o caso da empresa de energia Enron, protagonista de um escândalo de fraudes contábeis que a levou à falência em 2001.

“Eles tinham o único princípio de 'quem for o mais esperto' da sala tem a maior quantidade de recursos, de funcionários, que trabalhariam duro para ganhar muito dinheiro. Só que eles fizeram coisas terríveis: mentiram, manipularam. O estado da Califórnia perdeu bilhões de dólares por causa disso”, diz John.

“Em essência, se você não ensina as crianças de que é importante usar a empatia e de que as pessoas têm o direito de serem respeitadas, você terá uma sociedade em que as pessoas não cooperam, brigam, e não trabalham juntas. Tudo vai por água abaixo, porque precisamos viver juntos”, acrescenta.

O pesquisador menciona ainda o atual presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, como alguém em que competências socioemocionais fazem falta. Para ele, Trump incentiva o ódio nas pessoas ao hostilizar imigrantes e ao pretender barrá-los com a construção de um muro entre o país e o México.

“Na minha perspectiva, ele é um ótimo exemplo de alguém que não cresceu e não aprendeu algumas dessas competências emocionais. Há um artigo recente que diz que os Estados Unidos são governados por um garoto de 5 anos de idade. A ideia é de que ele tem um tipo de desenvolvimento social equivalente a alguém de 5 anos. Ele não entende que o mundo é complexo e temos diferentes perspectivas”, analisa.

Desafios para o século 21

O diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna, Mozart Neves Ramos defende que complexidade da sociedade do século 21 torna a enfatização das competências emocionais mais urgente nas escolas. Segundo ele, essa não deve ser exatamente uma disciplina no currículo de ensino, mas um assunto que permeia todo o dia a dia escolar, como o planejamento de uma aula e até a arquitetura das salas de ensino.

“Essa educação para o século 21 não é nada mais do que colocar, de maneira intencional na escola, o desenvolvimento dessas competências para que crianças, jovens, professores e gestores possam se desenvolver em sua plenitude e estejam preparados para essas mudanças tão bruscas que estão acontecendo neste século. Com isso, essas pessoas podem ser mais flexíveis e colaborativas”, diz.