Centros socioeducativos aliam punição com ressocialização
O local não é um presídio, é um centro socioeducativo. As celas são chamadas de alojamentos, os pavilhões de núcleos, e os presos de adolescentes acautelados. Os nomes podem mudar, mas a punição é a mesma. Quem está ali, cercado por grades, muros altos e arames farpados, está privado de liberdade e tem que seguir regras rígidas. Se não fosse a sensação real de encarceramento, a unidade poderia se passar por uma escola, já que a maioria dos internos tem rosto de menino. Mas a pouca idade não impediu que eles cometessem crimes, no caso, atos infracionais. E é por isso que hoje eles dividem “quartos” pequenos e escuros. A reportagem de O TEMPO visitou o Centro Socioeducativo (CSE) Horto, na região Leste da capital, onde 75 adolescentes estão em alojamentos – dois ou três em cada. Com as mãos para fora das janelas de grade, eles gritavam para chamar a atenção durante as quase duas horas em que alguns foram entrevistados. Em comum, além do fato de quererem ser ouvidos para sair das “celas”, os jovens se mostram contra a redução da maioridade penal – em discussão no Congresso Nacional. “Isso aqui já é cadeia, tem grade para todo lado”, gritou um interno. Assim como ele, a juíza Valéria da Silva Rodrigues, titular da Vara Infracional da Infância e Juventude de Belo Horizonte há dez anos, entende que reduzir a maioridade penal não irá diminuir a criminalidade entre adolescentes. “A medida socioeducativa não é pena, mas eles estão ali presos para cumprir uma sanção. Estão sendo punidos. E, no tempo de privação, temos a obrigação de recuperá-los para que eles retornem como pessoas melhores para a sociedade”, afirma. Na opinião da magistrada, que também atuou por 13 anos em varas criminais comuns, o que diferencia a unidade de internação de um presídio para adultos é que “o modelo socioeducativo é um sistema que recupera, a estrutura penitenciária, não”. Segundo a juíza, nos presídios, cerca de 70% dos presos reincidem no crime. “Nosso índice de reincidência, de 15%, mostra que, se forem dadas oportunidades, eles (menores infratores) podem seguir outros caminhos”, avalia. Essa situação é vivida na prática por João*, 16, que há um ano e seis meses está acautelado no CSE Horto. Ele entrou na unidade na quinta série escolar, e agora, já cursa o oitavo ano. O rapaz corta o cabelo dos colegas lá dentro e sonha em ser cantor de “funk consciente”. “Se colocar um adolescente de 16 anos no meio de bandidos perigosos, o menino vai buscar mais conhecimento no crime”, acredita. “Cresci num lugar onde só tinha gente armada, vendendo droga, aí fui me espelhando no que estava perto”, acrescenta o rapaz, que cumpre a medida por roubo. Pela manhã, todos os internos assistem a aulas na escola da unidade. Isso vai possibilitar a Francisco*, que, ao sair da unidade, com 19 anos, tenha o ensino médio concluído. “Se eu não tivesse sido pego, ainda estaria roubando e na oitava série. Aqui, eu estou preso, mas tenho atividades educativas, bem diferente da cadeia. Não posso mais vacilar”.
* Por se tratar de menores, foram usados nomes fictícios