Trabalho infantil deixou mais de 20 mil acidentados graves nos últimos oito anos
No Brasil, morreram 187 crianças e adolescentes com idades entre cinco e 17 anos durante o trabalho nos últimos oito anos. Outros 518 jovens tiveram a mão amputada em acidentes na jornada de trabalho. Essas mortes e amputações fazem parte dos 20.770 casos graves de acidentes trabalhistas envolvendo crianças e adolescentes entre 2007 e 2015. Os dados, que o R7 teve acesso com exclusividade, são do Sinan (Sistema de Informações de Agravo de Notificação) do Ministério da Saúde. O levantamento vai servir de base para as discussões do Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, no dia 12 de junho.
O Sinan reúne as informações fornecidas pelos agentes da rede pública de saúde sempre que for constatado, durante o atendimento médico, que há indícios que o acidente ou o adoecimento tem relação com alguma atividade profissional.
"Os dados do Sinan dão um panorama da face trágica do trabalho infantil no país, mas acredito que existe uma subnotificação e que o número de mortes e mutilações são bem maiores", disse Isa Maria Oliveira, secretaria-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil.
A maioria das vítimas trabalhava como como açougueiro, servente de obras, empregado doméstico, atendente de lanchonete, trabalhador agropecuário, entre outras atividades consideradas de alto risco e, por isso, proibidas por lei para menores de 18 anos.
"A única maneira de corrigir isso é acabar com o trabalho infantil, que acontece principalmente fora do modelo formal de produção. As empresas precisam investigar a origem dos seus insumos, monitorar a cadeia de produção e não aceitar fornecedores que exploram crianças e adolescentes", disse Isa Maria.
De acordo com os dados do fórum, as regiões Sul, Norte e Nordeste têm os maiores índices de trabalho infantil.
"A sociedade também precisa se responsabilizar pelo aumento do trabalho infantil. Há um falso mito de que 'é melhor estar trabalhando do que roubando', porém, é comprovado que o resultado é perverso e essa não é uma solução, pois reduz as chances de qualificação profissional e causa a baixa escolarização. Além disso, nota-se que o trabalho infantil é um mal que atravessa gerações. As crianças que estão nas praias, faróis e casas noturnas são filhas de pais que também passaram por isso", disse Isa Maria.
As crianças e adolescentes são mais vulneráveis aos acidentes de trabalho.
"Elas ainda não estão com o desenvolvimento físico e intelectual completo, não têm a visão periférica apurada como os adultos e não têm habilidade ou força suficiente para operar os equipamentos ou aguentar as jornadas", disse Isa Maria.
Por conta da fragilidade dos jovens, o advogado e coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos de São Paulo, fundador da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB Nacional, Ariel de Castro Alves, defende a criminalização do trabalho infantil para responsabilizar os empregadores. Atualmente, as empresas flagradas explorando o trabalho infantil são multadas e podem, no máximo, serem lacradas.
"Em caso de morte do trabalhador adolescentes, o empregador pode ser acusado de assassinato culposo, pois assumiu o risco eventual do acidente ao contratar um menor. No caso da mutilação, o crime seria lesão corporal grave. No entanto, deveria existir a criminalização da exploração do trabalho infantil", disse o advogado.
Alves destaca também que a flexibilização das leis de trabalho e a crise econômica são ingredientes que podem aumentar nos próximos meses a incidência de trabalho infantil e acidentes envolvendo crianças e jovens.
"O problema está se agravando e o trabalho infantil é a porta de entrada para outras situações de risco como as drogas e a exploração sexual. Somos a 7ª maior economia do mundo ao mesmo tempo somos a 85ª nação no Índice de Desenvolvimento Humana. Assim como a classe política tem se caracterizado pela corrupção, o lado empresarial e comercial tem como foco o lucro e o enriquecimento, ambos às custas da exploração do trabalho. Muitas vezes, as crianças são as vítimas e a sociedade é conivente com isso", afirmou.