Ao Supremo, PGR defende vacinação obrigatória para crianças

Veículo: Valor Econômico - BR
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O procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu no Supremo Tribunal Federal (STF) que pais ou responsáveis não podem deixar de vacinar os filhos — crianças e adolescentes — alegando questões filosóficas, morais, existenciais ou ideológicas.

O processo, que tramita na Justiça desde 2015, deve ser julgado em plenário logo após as eleições de novembro – e pode ser um teste sobre como a Corte vai se manifestar sobre a obrigatoriedade da vacinação contra a covid-19 no Brasil.

O caso diz respeito a uma ação civil ajuizada pelo Ministério Público de São Paulo para obrigar um casal a regularizar a vacinação do filho. Os pais haviam ignorado o calendário estabelecido pelas autoridades de saúde por serem “adeptos da filosofia vegana e contrários a intervenções medicinais invasivas”.

Em parecer solicitado pelo relator do recurso, ministro Luís Roberto Barroso, a Procuradoria-Geral da República (PGR) diz que o princípio constitucional da proteção integral à infância deve se sobrepor ao direito dos pais de exercerem a sua liberdade de convicção.

“Vacinar uma criança objetiva não apenas proteção individual, mas a de todos os demais cidadãos. Diversas doenças foram extintas graças ao advento da vacina, e compreender sua importância faz parte do senso de responsabilidade social”, diz o texto.

Para Aras, a obrigatoriedade da imunização é questão de saúde pública – “direito de todos e obrigação do Estado que reduz o risco de doenças e aumenta a expectativa de vida dos seres humanos”. A PGR, contudo, não especifica se esse entendimento deverá ser repetido quando a controvérsia da covid-19 chegar a julgamento no STF.

Nos bastidores do tribunal, ministros e auxiliares ouvidos reservadamente pelo Valor ponderam que as situações não são idênticas. Isso porque, no recurso de 2015, fala-se de vacinas comprovadamente seguras, obrigatórias segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e previstas há mais de 40 anos no Programa Nacional de Imunizações (PNI).

No caso da vacinação contra a covid-19, as circunstâncias são consideradas mais delicadas: as vacinas que estão sendo desenvolvidas ao redor do mundo ainda estão em fase de testes, de modo que ainda pairam incertezas sobre os seus possíveis efeitos colaterais e, mais ainda, sobre a sua real eficácia no combate à doença.

Apesar disso, ao julgar o recurso do caso de São Paulo, é improvável que os ministros se eximam de traçar paralelos e analogias com o atual contexto do país. Eles consideram haver questões jurídicas comuns aos dois casos, como os limites das liberdades individuais quando o assunto é saúde pública – tema que ainda não é pacífico nos tribunais brasileiros.

No processo do casal de São Paulo, por exemplo, o juízo de primeiro grau considerou que os pais tinham liberdade de agir quanto à educação e à saúde dos filhos. Já em segunda instância, os chamados “movimentos antivacina” foram mencionados como causadores de “grave risco à cobertura imunológica de doenças infecciosas na sociedade”.

Como a tramitação desse processo está mais adiantada do que as ações recentemente ajuizadas por partidos políticos contra o presidente Jair Bolsonaro, que já se disse avesso à vacinação compulsória contra o novo coronavírus, a tendência é que esse julgamento chegue antes à pauta do plenário.