‘As mães brasileiras precisam ser orientadas a não engravidar’
O Brasil pode estar sendo palco da manifestação de um vírus capaz de incapacitar um número sem precedentes de brasileirinhos. Informe epidemiológico divulgado no dia 24 de novembro pelo Ministério da Saúde (MS) atesta que já são 739 casos notificados de microcefalia em recém-nascidos de 160 municípios de nove estados brasileiros do nordeste e centro-oeste. As causas do problema parecem ser complexas e ainda estão sendo investigadas pelas autoridades sanitárias. Mas há fortes suspeitas de que estejam relacionadas à entrada em circulação no país do Zika vírus, transmitido pelo aedes aegypti, aquele mosquito velho conhecido dos brasileiros por conta da dengue. É um quadro grave que, na avaliação de um dos maiores patologistas do país, o médico, professor da USP e pesquisador de Harvard, Paulo Saldiva, precisa ser tratado com a seriedade que a situação requer. “As mães brasileiras precisam ser orientadas a, se possível, não engravidar neste período”, alerta ele. Entretanto, o que se vê, na avaliação dele, é um ministro da Saúde que abusa da cautela enquanto apura melhor as causas do problema e parece esperar uma intervenção divina. Na imprensa, o assunto é tratado com um distanciamento que quase chega a configurar total invisibilidade.
Na dúvida, o melhor é agir
Conforme Saldiva, a microcefalia pode ser decorrente de fatores diversos, que vão desde agentes contaminantes ambientais, como verificado, por exemplo, após o desastre radiativo em Cubatão, até deficiências nutricionais, como a de vitamina B-12 ou de ácido fólico, passando por infecções virais que a gestante contrai, como pode ser o caso do Zika vírus. Era, até então, considerado um problema de incidência relativamente rara no país, embora grave. Em 2014, foram 147 casos notificados no país inteiro. Em 2013, 167. “A microcefalia é um evento relativamente raro, mas muito incapacitante. A cabeça fica pequena porque o cérebro não cresceu. Então, há um prejuízo no desenvolvimento cerebral. E a pessoa vai ter várias sequelas: convulsões frequentes, retardo cognitivo, surdez, problemas motores. Dependendo da região do cérebro que não ficou legal, essas pessoas vão necessitar de acompanhamento para a vida inteira”, esclarece. Por isso, Saldiva defende que, ainda que as autoridades públicas ainda não tenham certeza de que a causa é virótica, a hora é de agir. “Como não existe vacina e nem tratamento para o Zika, a única possibilidade de conter o avanço da microcefalia, se a causa for mesmo o vírus, é pedir as mães que evitem engravidar e, se já estiverem grávidas, que evitem ter contato com pessoas com suspeita de dengue ou mesmo com o mosquito transmissor. Na dúvida se a causa é ou não o Zika vírus, o melhor a se fazer é trata-lo como se fosse”, aconselha.