Brasil tem histórico de alto índice de violência escolar: veja dados sobre agressão contra professores

Veículo: Globo.com - BR
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Violência escolar: ataque com faca em uma escola estadual de São Paulo que deixou uma professora morta e mais quatro pessoas feridas jogou luz sobre violência nas salas de aula do país

O ataque a faca em uma escola estadual de São Paulo que deixou uma professora morta e mais quatro pessoas feridas nesta segunda-feira (27) jogou luz sobre a violência nas salas de aula do país, que tem histórico de índices elevados de agressão contra docentes.

O agressor era um aluno de 13 anos do oitavo ano na escola. O vídeo acima mostra o momento em que ele foi desarmado por duas professoras.

Há anos, pesquisas têm indicado a alta incidência de casos de agressão, colocando o Brasil no topo da violência escolar. Veja os dados mais recentes divulgados:

? Topo do ranking em agressões

Levantamento global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) coloca o país entre os de índices mais altos do mundo no ranking das agressões contra professores – e que têm se mantido estável nos últimos anos.

  • Ambiente mais propício ao bullying: estudo divulgado em 2019 apontou que as escolas brasileiras são ambiente mais propício ao bullying e à intimidação do que a média internacional. Foram entrevistados 250 mil professores e líderes escolares de 48 países ou regiões.
  • Situações de intimidação: 28% dos diretores escolares brasileiros relataram ter testemunhado situações de intimidação ou bullying entre alunos, o dobro da média da OCDE.
  • Abuso verbal: semanalmente, 10% das escolas brasileiras pesquisadas registram episódios de intimidação ou abuso verbal contra educadores, segundo eles próprios, com “potenciais consequências para o bem-estar, níveis de estresse e permanência deles na profissão”, diz a pesquisa. A média internacional é de 3%.
  • Agressividade “normalizada”: A OCDE não analisou os motivos por trás desses índices, mas apontou que o bullying e a agressividade acabaram sendo “normalizados” e minimizados, com impactos negativos sobre o aprendizado.
  • Intimidação semanal: Em 2017, estudo semelhante da OCDE mostrou que 12,5% dos professores ouvidos no Brasil disseram ser vítimas de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana. Era o índice mais alto entre os 34 países pesquisados – a média entre eles é de 3,4%.
? Agressão verbal, discriminação, bullying…

Na rede estadual paulista, o Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo (Apeoesp) divulga com frequência estudos sobre o ambiente escolar.

  • Aumento de casos: A pesquisa mais recente, de 2019, apontou que 54% dos professores já tinha pessoalmente sofrido algum tipo de violência. Em 2017, eram 51% e, três anos antes, 44%.
  • Violência mais comum contra professores: Entre elas, as mais frequentes eram agressão verbal (48%), assédio moral (20%), bullying (16%), discriminação (15%), furto/roubo (8%), agressão física (5%), e roubo ou assalto à mão armada (2%).
  • Alunos como alvo: 37% dos estudantes relataram ter sido vítimas de agressão. Em 2017, foram 39% e, em 2014, 28%.
  • Violência mais comum contra estudantes: bullying (22%), agressão verbal (17%), agressão física (7%), discriminação (6%), furto/roubo (4%), assédio moral (4%), e roubo ou assalto à mão armada (2%).
? Briga teria sido o motivo

O ataque na escola estadual de São Paulo teria sido motivado por uma briga entre alunos dias atrás que foi apartada pela professora que morreu esfaqueada nesta segunda-feira.

Segundo o relato de um estudante, o agressor, há alguns dias, xingou um colega de “preto” e “macaco”, o que gerou uma briga entre eles. A professora Elisabete Tenreiro, de 71 anos, foi a responsável por separá-los. O agressor, então, a ameaçou de vingança.

Foi assim: chamou o menino de preto e macaco. O outro menino (vítima de racismo) não gostou e partiu para cima dele. A professora “Beth” separou. Aí hoje esse menino que chamou o outro de macaco veio com uma faca e esfaqueou várias vezes aqui e aqui (disse ele tocando na cabeça). Ele já falou que iria fazer isso, mas ninguém acreditava.
— Gabriel, que estuda na mesma sala do autor das agressões
Violência escolar: atentado em escola em São Paulo — Foto: Arte/g1

Atentado em escola em São Paulo — Foto: Arte/g1

? Aumento dos casos

Para a pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Betina Barros, ataques como o desta segunda-feira em São Paulo não eram comuns no Brasil e passaram a acontecer com mais frequência a partir de 2018.

Na avalição dela, isso é resultado de diversos fatores que se tornaram mais presentes neste período:

  • Isolamento social: durante a pandemia, os estudantes tiveram que ficar em casa, convivendo apenas com a família e dependendo da tecnologia para interações sociais.
  • Exposição à violência: nos espaços familiares, algumas crianças e adolescentes estiveram expostos a violência e maus-tratos.
  • Tecnologia: o acesso à internet sem mediação de um responsável tornou mais fácil o consumo de fóruns da internet, muitos na deep web, que disseminam ideias e conteúdos violentos. “Não à toa, muitos grupos racistas, conservadores e neonazistas se proliferam nestes ambientes”, explica a especialista.
  • Polarização: no mesmo período, boa parte das relações estremeceram diante da polarização sanitária, social e política no país, o que pode ter servido como combustível para ideias mais extremistas.

Tudo isso pode ter influenciado o cenário atual em que os casos de violência no ambiente escolar acontecem com uma recorrência cada vez maior.

? Um caminho para a solução

A especialista avalia que um dos caminhos que podem levar à solução o problema é interseccional e deve ter trilhado por todos envolvidos na proteção da criança e do adolescente.

De acordo com ela, devem ser criados mecanismos objetivos de controle destas situações que permitam identificar onde os casos de ataque estão ocorrendo e por que ocorrem. Além disso, o bullying deve ser combatido por todos.

“Precisamos entender que qualquer tipo de bullying no ambiente escolar não é aceitável. Assim como estamos entendendo que violência contra a mulher não pode ser ignorada, a violência sofrida pelas crianças não é menor e também não deve ser normalizada”, defende Betina.

 

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