Como a música ajuda no desenvolvimento cognitivo das crianças

Veículo: Nova Escola - BR
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As aulas de música não são apenas divertimento ou uma possibilidade de expressão para crianças e jovens, são importantes também para o desenvolvimento cognitivo, o raciocínio linguístico e a memória, e tudo isso é essencial ao futuro acadêmico de todos. Essas conclusões estão em um estudo da Universidade de Amsterdã, na Holanda, e foram publicadas na revista científica Frontiers in Neuroscience. Mas para alguns professores brasileiros, a prática da musicalização nas escolas já evidencia bons resultados há tempos.

“A música é para todos”, afirma Mônica Marsola, professora de música de um projeto no Complexo Educacional Unificado (CEU) Regina Rocco, em São Bernardo do Campo, em São Paulo. Segundo ela, independentemente de dom ou talentos, a música como parte da Educação pode servir de diferentes formas aos alunos. “Os ganhos pedagógicos são muitos”, diz a professora que também leciona em uma escola particular da capital paulista. “Se uma pessoa teve uma infância musical saudável, ela ouvirá com senso crítico e terá um repertório maior”.

Mônica percebe aquilo que os pesquisadores holandeses concluíram na pesquisa em sua rotina escolar: os alunos que têm contato com aulas de música apresentam uma melhora substancial em suas habilidades cognitivas – como planejamento e inibição. “Uma criança mais tímida pode desenvolver formas de socialização, outra mais agitada percebe que tem que esperar sua vez para tocar determinado instrumento e compor a atividade”, conta. Esse é um ponto muito importante se considerarmos que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) considera o ensino das competências socioemocionais, que incluem autoconfiança, colaboração, resiliência, entre outros.

Já Marina Cipolla, supervisora do projeto Escola de Música e Cidadania da ONG Amigos do Bem, enfatiza que a superação de problemas e dificuldades também pode ser vivida através da música. “Vemos o amadurecimento experimentado por alunos que começam a se envolver com a música”, diz. “Eles desenvolvem disciplina para praticar um instrumento, por exemplo, e isso pode ser levado para casa”.

Maior repertório
Marina explica que os alunos, tanto os mais novos quantos os adolescentes, são estimulados nas aulas a relacionarem suas criações musicais com discussões presentes em seu convívio. “Muitos deles são moradores de comunidades vulneráveis e a reflexão sobre direitos humanos aparece em muitas músicas”, conta. A prática pedagógica de estimular composições próprias também é experimentada por Mônica Marsola no CEU Regina Rocco, onde os alunos, inclusive, constróem seus instrumentos. “A criatividade e ampliação de experiências vividas são possíveis”, afirma.

Para isso, a introdução da música como prática pode começar cedo na escola e se dá de diversas formas. A professora de música recomenda que seja vinculada e adaptada ao que o aluno está vendo e descobrindo naquela faixa etária ou ambiente. “Com alunos pequenos, começamos com cantigas que eles conhecem, apresentamos outras e, assim, eles descobrem o ritmo, começam a interagir com a música através do corpo, batendo palmas, por exemplo, até iniciarem a experiência com instrumentos de percussão”, explica. Mais tarde, as crianças podem experimentar outros instrumentos, como os de sopro e corda.

Mônica mostra ainda que é possível realizar atividades em parceria com outros professores e potencializar a prática das aulas de música e os aprendizados em outras áreas. “Certa vez, fiz uma atividade em conjunto com a professora do ensino infantil em que ela mostrava os animais que vivem no mar e, nas minhas aulas, fizemos músicas que apresentavam essa fauna”, exemplifica.

Comunicação e linguagem
“A música é uma linguagem muito importante”, ressalta a supervisora do Escola de Música e Cidadania. De acordo com Marina Cipolla, os alunos que entram em contato com a música descobrem mais uma forma de expressão, o que ajuda no raciocínio e nas associações feitas pelas crianças. “E isso pode ajudar em matemática ou outras disciplinas”.

Mônica Marsola também lembra que o contato com a musicalização desenvolve a escuta entre os alunos, já que as crianças precisam estar atentas ao que o colega toca, quando é sua vez e quais sons estão sendo reproduzidos. “Para muita coisa, tanto na escola quanto na vida, a escuta é essencial”, comenta. A professora mostra que, dessa forma, a busca de um equilíbrio na socialização também se evidencia, uma vez que os alunos percebem como os amigos participam da atividade.

“Não perguntamos se um aluno quer ser poeta para então mostrar uma poesia para ele, assim deve ser com a música”, argumenta Mônica, enfatizando que o ensino de música não deve ser praticado apenas com o intuito de formar futuros instrumentistas, mas, sim, como mais uma linguagem possível à comunicação de todas as crianças, devidamente inserida na rotina escolar.

Disposição e organização
Alguns alunos do projeto Escola de Música e Cidadania começaram aulas de violino há seis meses. Essa iniciativa os ajudou as crianças e os adolescentes a desenvolver maior responsabilidade. “Eles levam o instrumento para casa, sabem que precisam cuidar dele”, afirma. Além disso, os alunos acabam praticando exercícios fora das aulas, treinando em casa. “É a mesma lógica de outras disciplinas nas escolas”.

No começo das aulas, algumas crianças chegavam muito agitadas, mas aos poucos perceberam que a calma também é importante para o aprendizado. Elas entenderam que existe uma postura, que é preciso concentração, lembra Marina. Até dificuldades físicas foram, com o tempo, superadas, como uma aluna com deficiência motora que agora consegue segurar o instrumento.

Para bons resultados, Mônica Marsola enfatiza que não se deve esquecer o lúdico no ensino da música. “Começar experimentando é sempre uma boa saída, para mais tarde teorizar e aprofundar, se for do interesse do aluno”, diz. A disposição em aprender, assim, fica mais evidente entre as crianças, que até podem se descobrir apaixonados pela música ou por um instrumento, mas estão, na verdade, desenvolvendo suas habilidades e competências nessas aulas.