Como é o trabalho do IGP que transforma depoimentos de crianças e adolescentes vítimas de crimes em prova pericial

Veículo: GaúchaZH - RS
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Instituto-Geral de Perícias (IGP) é o órgão responsável por realizar as perícias físicas e psíquicas que comprovam os crimes cometidos contra crianças. No Rio Grande do Sul, em 2022, 10.083 menores de 18 anos sofreram assédio sexual, importunação sexual, estupro, estupro de vulnerável, lesão corporal, maus-tratos, tentativa de homicídio e homicídio. O dado é do levantamento do Observatório da Secretaria de Segurança Pública (SSP) feito a pedido de GZH.

— São cuidados importantes no sentido de uma vez obtida essa prova, ela seja compartilhada entre os vários atores envolvidos para que a gente consiga evitar múltiplas entrevistas. Que essa entrevista que foi documentada em áudio ou vídeo pela perícia oficial possa ser fornecida para esses vários atores para que ocorra de fato uma proteção integral a essa vítima — destaca Angelita.

Ela lembra que a revitimização pode gerar novos traumas para essas crianças e adolescentes vítimas.

— Se nós acabarmos estimulando essa criança e adolescente a retornar a mencionar o fato traumático, é como se nós dificultássemos esse processo de cicatrização, se nós pensarmos que uma violência desse potencial pode ser análoga a um ferimento. E quando ele começa a fechar, nós estamos ali movimentando aquele entorno novamente — complementa.

A lei 13.431 estabelece mecanismos e princípios de integração das políticas de atendimento e propõe a criação de Centros de Atendimento Integrados para crianças e adolescentes. São dois tipos de procedimentos: escuta especializada, quando ocorre nos serviços de saúde e assistência social onde a criança será atendida; e depoimento especial, quando a criança então fala o que aconteceu, mas num ambiente acolhedor, por profissional capacitado no protocolo de entrevista.

Os peritos seguem protocolos internacionais para essas entrevistas. São realizadas reuniões quinzenais para discutir e aperfeiçoar essa metodologia. Também participam de revisões com profissionais do exterior a cada dois anos para aprimoramento. O protocolo usado é o NICHD (do National Institute of Child Health and Human Development, dos Estados Unidos, desenvolvido em parceria com Canadá, China, Escócia, Israel, Portugal, Reino Unido, Suíça e Brasil).

Trata-se de uma espécie de formulário de 16 páginas, que possui perguntas e orientações sobre como agir com as mais variadas respostas ou gestos. Em determinada altura desse chamado “Guia de Entrevista Forense NICHD1”, há a indicação para “repetir toda a seção se necessário para cada incidente descrito pela criança”.

— Em geral, as crianças e os adolescentes se adaptam muito bem a essas questões. Porque existe um vínculo entre entrevistador e periciado que ele vai se formando ao longo dos passos que esse protocolo traz. Em primeiro lugar a criança vai se ambientar ao espaço que ela está. Ela vai tratar de assuntos não relacionados diretamente ao trauma. E a partir daí, nós vamos seguir as partes mais específicas, que são aquelas que vamos trabalhar efetivamente os elementos do complexo probatório que interessam à autoridade que está investigando — explica Angelita.

Conforme a diretora do DML, se esses passos forem seguidos corretamente, os resultados são muito bons do ponto de vista qualitativo e quantitativo do conteúdo. Explica que é feita uma avaliação prévia para saber se a vítima está em condições de fazer o relato naquele momento da abordagem.

— Na grande maioria dos casos envolvendo violência sexual, temos até 96% dos casos de perícia física negativa, ausência de vestígios materiais. E o oposto, 70% a 80% de evidências psíquicas que falam sobre uma situação traumática — destaca.

Nas perícias psíquicas atuam peritos criminais psicólogos e peritos médico-legistas psiquiatras. Na área da sexologia forense, o trabalho é feito pelos peritos médico-legistas. O tempo para conclusão desses laudos é variável, durando em média três semanas. Mas dependendo da urgência de quem está investigando, para a realização de uma prisão preventiva, por exemplo, pode sair em até 24 horas.