Mais de oito mil denúncias sobre ameaças a escolas foram enviadas ao Ministério da Justiça desde ataque a creche

Veículo: O Globo - RJ
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denúncias sobre ameaças a escolas
Foto: Anderson Coelho/AFP

Denúncias sobre ameaças a escolas: pico de informações em canal criado este mês foi registrado entre os dias 10 e 12; queda em números depois é atribuída a uma migração de conteúdos extremistas para a deep web 

O Canal Escola Segura, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, recebeu através da internet entre os dias 7 e 24 de abril um total de 8.513 denúncias. Os maiores números foram registrados nos dias 10, 11 e 12 deste mês, quando passaram de mil. O período coincide com uma onda de boatos impulsionados por grupos extremistas em redes sociais sobre ataques a escolas, que causou em todo o país pânico em alunos, pais e professores. No dia 10, foram recebidas 1.346 denúncias; no dia 11, 1.836; e, no dia seguinte, 1.798. Os números não consideram informações duplicadas encaminhadas pelo canal.

Já na última segunda-feira, foram 86 denúncias enviadas pelo canal digital (www.gov.br/mj/pt-br/escolasegura), criada pela ONG Safernet em tempo recorde para o ministério. O número diário só não é menor do que o contabilizado no primeiro dia de funcionamento da ferramenta, em 7 de abril, quando o total foi de 49. O sistema foi colocado no ar dois dias após o massacre numa creche de Blumenau (SC). Quatro crianças morreram e cinco ficaram feridas durante ataque de um homem de 25 anos.

A redução nos números pode estar ligada a uma nova nova migração de conteúdos extremistas, que tinham saído da deep web e passado a ficar visíveis em redes sociais abertas. O delegado da PF Carlos Eduardo Sobral, que comanda a Inteligência dentro da Secretaria Nacional de Segurança Pública, analisa que ações de exclusão de conteúdos, investigações, operações e até mesmo prisões e apreensões ocorridas nas últimas semanas devem ter feito integrantes desses grupos que vinham espalhando ameaças e recrutando jovens para ataques retornarem para o lado obscuro da internet.

— A gente identificou o fenômeno de que algumas comunidades que atuavam no subterrâneo da internet vieram para a superfície, para redes sociais abertas, como Twitter, Tiktok e Instagram. E esse movimento é muito nítido com a quantidade de denúncias, que chegaram a mais de 1.800 num dia, indicando a grande quantidade de conteúdo sendo publicizado nas redes abertas — afirma Sobral, completando. — Na sequência, e junto ao trabalho de um sistema de cooperação, com exclusão, investigação, prisões e apreensões, vamos percebendo que essa migração para a superfície se inverteu: as pessoas decididas a praticar esse tipo de conduta estão voltando para o subterrâneo da internet, o que levou a uma diminuição do volume de conteúdo na superfície. Por isso, recebemos cada vez menos denúncias.

Denúncias em queda

Gráfico do ministério mostra redução nas denúncias nos últimos dias. No dia 20, data que gerou muita preocupação por ser a do massacre de Columbine (EUA), ocorrido em 1999, o canal processou 248 links enviados anonimamente. Mas, com exceção dessa data, desde o dia 15 as denúncias não batem a casa de 200. Uma parcial de ontem, terça, totalizava apenas 25 denúncias únicas.

Especialistas afirmam que, contra o medo nas escolas gerado por grupos extremistas que operam nas redes, é preciso que as pessoas denunciem e que haja investigação, remoção de conteúdos e responsabilização das plataformas. Essa combinação de ações, além de educação digital nas unidades de ensino, ajudará a frear a atuação de pessoas que hoje estimulam ataques e espalham boatos. No canal Escola Segura, as informações encaminhadas pelo link são analisadas diretamente por uma força-tarefa formada por 50 policiais do Laboratório de Operações Cibernéticas (CiberLab) da Secretaria Nacional de Segurança Pública.

As denúncias são verificadas primeiro por uma equipe que envia às polícias dos estados conteúdos de caráter urgente, para que ataques sejam impedidos. Depois, o material passa por nova varredura, para enriquecimento de dados e encaminhamento para investigação. O chefe da Inteligência do Ministério da Justiça vê resultados positivos nesse período de funcionamento da ferramenta:

— Um dos objetivos de quem alimenta essa subcultura é o recrutamento e cooptação de pessoas em estado de vulnerabilidade. E na internet aberta o alcance desse discurso de ódio é muito maior, e o recrutamento mais eficiente. A gente tirar da internet aberta esse conteúdo diminui o alcance dessa prática. Nas comunidades fechadas, participam quem já esta envolvido — explica.

Esclarecimento aos leitores sobre cobertura de ataques e massacres pelo Grupo Globo

A respeito do ataque ocorrido a uma creche em Blumenau (SC), no qual quatro crianças foram mortas e outras cinco, feridas, o Grupo Globo divulgou nota sobre as diretrizes que orientam a cobertura de casos de ataques e massacres de seus veículos de imprensa:

“Os veículos do Grupo Globo tinham há anos como política publicar apenas uma única vez o nome e a foto de autores de massacres como o ocorrido em Blumenau. O objetivo sempre foi o de evitar dar fama aos assassinos para não inspirar autores de novos massacres. Essa política muda hoje e será ainda mais restritiva: o nome e a imagem de autores de ataques jamais serão publicados, assim como vídeos das ações.

A decisão segue as recomendações mais recentes dos mais prestigiados especialistas no tema, para quem dar visibilidade a agressores pode servir como um estímulo a novos ataques. Estudos mostram que os autores buscam exatamente esta “notoriedade” por pequena que seja. E também não noticiamos ataques frustrados subsequentes, também para conter o chamado “efeito contágio”.

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