No Brasil, 2.083 crianças de até 4 anos morreram vítimas de agressão nos últimos 10 anos
No Brasil, 2.083 crianças de até 4 anos morreram vítimas de agressão nos últimos 10 anos, mostra levantamento da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria). Segundo especialistas, a maioria dos casos de agressão é cometida por parentes.
O estudo mostra também que, se forem consideradas as crianças de até 9 anos, o número sobe para 3.099 óbitos. Com a inclusão de adolescentes de até 19 anos, são 103.149 mortos.
Os dados são do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde de 2010 a agosto de 2020 e foram organizados pela SBP.
De acordo com Marco Antônio Chaves Gana, presidente do Departamento Científico de Segurança da SBP, o DataSUS de 2018 mostra que 83% dos casos das agressões em crianças de 0 até 9 anos envolvem pai ou mãe.
Gana diz que o caso do menino Henry Borel, 4, pode ser considerado um retrato do que muitas crianças têm sofrido ao longo dos anos. Segundo investigações da polícia, o menino sofria agressões do padrasto, Dr. Jairinho.
“A agressão pode ocorrer em qualquer família, isso independe de classe, cor, religião e escolaridade dos pais. Na maior parte, os casos em crianças ocorrem em relações intrafamiliares, como no do menino Henry. A repetição do ato pode durar anos, a maior consequência é a morte.”
A maior parcela de mortes, entretanto, está entre adolescentes de 15 a 19 anos, correspondendo a 93.511 casos na última década. Outro fator que explica esses óbitos nesta faixa etária seria o envolvimento com o tráfico de drogas.
De 2018 a 2019, o número de morte caiu em todas as faixas etárias de 0 a 19 anos, passando de 9.499 para 6.818. Porém, queda significativa foi registrada dos 15 aos 19 anos, de 8.696 para 6.175.
As principais causas de morte são agressões por meio de disparo de arma de fogo e objeto cortante, como faca.
Embora os dados de mortalidade de 2020 ainda sejam preliminares, Gana diz acreditar que, para conter a pandemia do novo coronavírus, as crianças ficaram mais expostas à violência doméstica e, consequentemente, pode haver aumento o número de casos letais.
“O isolamento domiciliar expõe crianças e adolescentes a maiores conflitos e tensões e à piora da violência intrafamiliar, sem que tenham condições de denunciar esta violência ou ser ela percebida pelos outros meios que estaria frequentando, como a escola.”
Apesar de considerar o número de mortes alto, Gana aponta que os dados são subnotificados. Isso porque muitos pais levam filhos para atendimento e, no caso das crianças, por exemplo, acabam dando outra justificativa para a lesão, dizendo que caíram, por exemplo.
“Às vezes, são internados, morrendo dias depois com diagnóstico da doença que consta do atestado de óbito, e são computados em outra estatística diferente de agressões.”
Gana acrescenta que a escola e os médicos têm papel fundamental na descoberta dessas agressões e devem denunciar para o Conselho Tutelar e o Ministério Público. Escola e o postos de saúde têm mais informação por causa do contato direto com a vítima.
Disse ainda que há sinais que podem indicar que as crianças estão sendo agredidas, como a mudança de comportamento, alteração no desenvolvimento físico e também no cognitivo.
Segundo ele, podem ser observados nas crianças hematomas, equimose, marca de dedos da mão do agressor, de objeto com cinto, fio de luz, queimaduras de cigarro ou faca e ferro de passar roupa.
Um outro ponto importante é ouvir as crianças e dar credibilidade ao que elas relatam.
“A criança pode ficar triste, chorosa, parar de brincar, emagrecer. Tem aquela que é agitada, agressiva sem muita explicação. Não só a marca no corpo indica a agressão, a situação comportamental pode dar sinal.”
A presidente da SBP, Luciana Rodrigues Silva, diz ainda que estudos científicos e a prática dos profissionais que lidam com a infância e a adolescência indicam que o tratamento humilhante, os castigos físicos e qualquer conduta que ameace ou ridicularize a criança ou o adolescente, quando não letais, podem ser extremamente danosos à formação de personalidade
“Nascer e crescer em um ambiente sem violência é imprescindível para que uma criança tenha a garantia de uma vida saudável, tanto física quanto emocional”, afirma.