Pais e escola devem ajudar crianças e adolescentes a entenderem o que sentem e as razões daquele sentimento
Pais e escola: ao convidar ao diálogo e evitando julgamentos apressados, é possível auxiliar o jovem a lidar com as emoções negativas, dizem analistas
Lidar com o choro da criança ou o silêncio introspectivo do adolescente são desafios diários de pais e professores. Mas entender que as “birras” e rebeldias da infância e da juventude expressam, em um vocabulário particular, reações negativas frente à realidade permite aos adultos ajudar os mais jovens a gerir suas emoções.
Uma emoção é uma reação mental – positiva ou negativa – a algum acontecimento. Bebês nascem com emoções básicas para sobrevivência, como raiva, alegria, tristeza e nojo, mas as refinam conforme aprendem a nomear o que sentem. Até lá, em vez de dizer “você me decepcionou e eu gostaria de um pedido de desculpas”, choram.
Já adolescentes, mesmo mais velhos, patinam para gerir emoções desencadeadas por bullying, pressão para render, desilusão amorosa e injustiças do mundo. Enquanto são exigidos a descobrir a sociedade e a si mesmos, não possuem repertório nem segurança para lidar com adversidades.
— A criança não sabe lidar com certas sensações nem as reconhece, só sente uma avalanche, assim como o adulto não sabe lidar em muitos casos. Tem que ter empatia para entender que a criança não sabe o que está acontecendo e ver se ela precisa de limite, de compreensão ou de carinho – diz Luciana Marques, professora na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Manejar as próprias emoções e reagir o tempo todo de forma civilizada é dificílimo até mesmo para adultos. Por vezes, ficamos confusos ao sermos dominados por emoções contraditórias — como um lampejo de ódio por uma pessoa amada que nos traiu. Crianças e adolescentes, também, com a diferença de que os pequenos manifestam emoções negativas com brincadeiras agressivas, sono intranquilo e mudanças de comportamento.
O mundo de hoje tampouco provoca emoções particularmente fáceis de manejar: pandemia de covid-19, colapso ambiental, catástrofes naturais, crise econômica e falta de perspectiva de emprego acentuam ansiedade e gatilhos para a depressão.
Durante a pandemia, um estudo publicado no periódico Research, Society and Development mostrou que as principais emoções expressas por adolescentes foram cansaço (63,6%), tristeza (45,5%), saudade do colégio e dos amigos (45,5%), falta das aulas presenciais (18%), indiferença (27%) e depressão (9%). Emoções positivas como alegria (27%) também foram identificadas. A chave é o diálogo.
— Um indivíduo pode estar manifestando algo que não é necessariamente problema dele, mas da sociedade. Se a família acolhe, está junto e conversa, os rompantes do jovem podem se dissolver com o tempo — acrescenta Marques.
Choro, grito, raiva e tristeza são reações ao mundo – portanto, ajudar crianças e adolescentes a entenderem o que sentem e por que sentem pode ser a grande boia de salvação em um oceano de emoções. Invalidar o que o jovem sentiu nunca ajuda, observa Chrystian Kroeff, professor de Psicologia na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e especialista em infância e adolescência.
— A criança chora e muitas vezes os pais falam: “Não chora”. É como dizer: “Não sinta”. Mas a gente não controla o que sente. Deve-se validar o sentimento e se mostrar como fonte de apoio. A família pode ajudar a nomear, dizendo: “Estou vendo que estás triste e chateado, mas vai passar”. O adulto tem linguagem para comunicação, mas a criança comunica pelo chorar e ao ficar emburrada — diz o psicólogo.
À escola, cabe oferecer um ambiente aberto ao diálogo, ensinar a importância de se comunicar e promover ações de diversidade nas quais jovens possam demonstrar sentimentos, observa a psicanalista Ana Laura Giongo, integrante da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (Appoa) e há mais de 30 anos trabalhando com crianças e adolescentes.
— Tem que sair da posição de julgar e punir para a de querer entender o que está acontecendo. Não se pode só punir. Muitas escolas têm feito trabalhos contra o bullying. Trabalhar a diversidade é importante: quando a cultura da escola é mais inclusiva, isso ajuda a evitar atitudes de preconceito — analisa.
Como pais podem ajudar seus filhos a lidar com emoções:
- Não menospreze reações dos filhos. Mostre-se receptivo ao que for trazido
- Ensine que momentos tristes fazem parte da vida, mas que seus filhos jamais estarão sozinhos e que você sempre estará por perto
- Incentive adolescentes a realizar atividades criativas para manifestar as emoções, como aulas de música e artes
Como escolas podem ajudar jovens a lidar com emoções:
- Atividades que ofereçam autonomia ajudam os jovens a perceber que vão colher as consequências de suas próprias decisões
- Projetos que envolvam música, jogos, esportes e videogames aproximam e incentivam o jovem a se expressar por meio de uma linguagem que domina
- Ansiedade e bullying são fenômenos sociais. Escolas que valorizam, em aula, a diversidade de raça, de orientação sexual e de cultura, ensinam que ninguém deve ser desrespeitado
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