Pedófilos usam redes sociais para fazer 1º contato com crianças e adolescentes
A Safernet, entidade que combate crimes e violações virtuais aos direitos humanos, recebeu no ano passado mais de 13 mil mensagens sobre aliciamento de crianças. O contato com o agressor costuma acontecer pelas redes sociais. Uma em cada cinco crianças e adolescentes (20%) que usam a internet no Brasil diz ter visto imagens ou vídeos com conteúdo sexual, e 18% receberam esse material por meio de mensagens e nas redes sociais.
“Muitas vezes as crianças demoram a perceber que tem algo de errado acontecendo”, diz Juliana Cunha, coordenadora psicossocial da Safernet. “Acham que de repente estão conversando com um amigo da mesma idade, esse amigo pode pedir alguma imagem. Não necessariamente ela percebe que aquilo se trata de uma violência.”
O ambiente da internet é o pesadelo de qualquer pai: o menor de idade está só, exposto a milhões de pessoas. A combinação, segundo a polícia, é um prato cheio para os pedófilos, e cada vez mais crianças são abordadas e induzidas a produzir material pornográfico. A maioria acaba sendo vítima de chantagem, sem que os pais sequer desconfiem.
“A inocência da criança permite que o sujeito vá se aproximando até um momento que ela percebe que não vai conseguir mais sair desse laço que ele a prendeu. Ela está ali presa, e com medo com que os pais tomem ciência do que ela trocou, falou”, diz Rodrigo Sanfurgo, delegado da Polícia Federal. “Mesmo que ele não tenha contato, ele acaba obrigando a criança a praticar atos sexuais e depois ele tem acesso a isso e compartilha.”
“Se tem tanto material desse tipo na internet é porque essas crianças em algum momento foram abusadas. Elas foram abusadas porque estavam vulneráveis de alguma forma. E alguém abusou. E existe uma indústria para isso”, afirma Renata Andrade Lotufo, juíza da 4ª Vara Criminal Federal de São Paulo.
Conversa com pedófilos
A consultora de negócios Luciana Chamon Silveira descobriu que o filho, de 12 anos, em um grupo de conversa com pedófilos.
“Eles chegaram a pedir nudes das crianças, chegaram a convidar eles para o – assim, era muito estranho no grupo, quando colocaram o vídeo, uma pessoa falou: "Nossa eu estava procurando esse vídeo", "eu queria colocar esse vídeo aqui", e o outro respondeu, "eu só não quero ser preso". Então eles sabiam o que estavam publicando ali.”
“Eu fiquei, assim, em estado de choque por mais de uma semana. Eu não acredito que ele está se relacionando com pessoas que ele desconhece e continua conversando, e continua fazendo aquele papel que se fala – não fala com desconhecido – é um desconhecido do mesmo jeito. Só que é um desconhecido virtual.”
Um estudo recente mostra que 17% das crianças e adolescentes que acessam a internet no país tiveram contato pessoal com alguém que conheceram no ambiente virtual.
“Ao mesmo tempo em que a tecnologia se tornou onipresente e possibilitou às crianças buscarem ajuda com os pais e os colegas, ou em canais especializados, a onipresença da rede no nosso cotidiano meio que apagou a fronteira entre o público e privado”, diz Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente da Safernet.
“Quando a gente fala: 'não aceita bala de estranhos' pros filhos, a coisa vai muito além disso agora com a internet. Porque hoje em dia qualquer um faz um perfil falso, pega a foto de um cara parecendo um Justin Bieber da vida, pega o perfil falso no Facebook, pede pra adicionar uma menina de 10 anos, começa a falar tudo o que ela quer ouvir e quando ela vê já está super envolvida e pode ser enredada numa coisa dessas”, diz a juíza Renata Lotufo.
Para especialistas e autoridades, o desafio é achar um equilíbrio entre proteger e moderar tanta conectividade e interatividade. Mas será que é possível fazer isso sem censurar?
“A gente ainda precisa caminhar muito nesse aspecto: qual é o papel da família, como ela pode mediar, que tipo de conteúdo é apropriado ou não, e a escola também”, diz Juliana Cunha, da Safernet. “Como aparece escola vai discutir cidadania, uso ético, que preparem a criança, para usar esse espaço da melhor forma. Nesse aspecto a gente tem um desafio de multiplicação de dispositivos hoje conectados à internet, que certamente nos vai convocar a pensar que ela vai estar o tempo todo na vida da pessoa.”