Pesquisa revela índice de estudantes que, além de estudar, já têm uma profissão

Veículo: Zero Hora - RS
Compartilhe

Uma pesquisa inédita revelou que um a cada três jovens que cursam os últimos anos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio na rede pública abandonam os estudos para se dedicar ao trabalho. O levantamento foi realizado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura e o Ministério da Educação (MEC). O resultado das entrevistas feitas com 8.283 alunos de 10 cidades brasileiras foi publicado no livro Juventudes na escola, sentidos e buscas: Por que frequentam?. Foram ouvidos alunos com idades entre 15 a 29 anos, matriculados no Ensino Médio da rede pública, na Educação de Jovens e Adultos (EJA) ou no  programa Projovem Urbano. Eles responderam questões que tinham como objetivo principal esclarecer a relação da nova juventude com a escola: qual o sentido dela em suas vidas, o que eles buscam nela e o que os motiva a frequentá-la. Durante as entrevistas, os pesquisadores identificaram que 20% dos frequentadores do Ensino Médio, além dos estudos, mantêm uma jornada de trabalho de oito horas diárias. Esse percentual chega a 40% no caso de alunos da EJA. "Isso não é uma novidade. A América Latina inteira, e o Brasil tanto quanto, têm um perfil de estudantes trabalhadores. A gente não pode naturalizar isso, mas também não pode pedir para que o aluno deixe de trabalhar. Essa é a nossa condição de país de terceiro mundo. Crescemos entendendo o trabalho como parte do processo de educação", afirma a professora do programa de pós-graduação em Educação da Unisinos, Edla Eggert. Para a professora da Universidade Católica de Salvador e uma das coordenadoras do estudo, Mary Castro, a grande supresa apresentada pela pesquisa é a revelação de que os jovens brasileiros abandonam os estudos cada vez mais cedo para ingressar no mercado de trabalho: Na EJA e no Projovem, isso já era esperado, que é o caso dos jovens que saíram da escola e depois retornaram. O que nos surpreendeu é a alta proporção, de um a cada três jovens, que abandonou os estudos nos últimos dois anos do Ensino Fundamental e no Ensino Médio para trabalhar. E esse número vem aumentando.

Escolas têm de se adaptar

Segundo Edla, esses dados sinalizam um novo caminho para a educação nacional, que deve investir no diálogo com os alunos para compreender mais as suas diferentes realidades. "É um tema importante para reafirmar a importância de as escolas se convencerem que nós temos alunas e alunos trabalhadores. Então, esta instituição não pode ter o modelo europeu ou americano, que o aluno tem que só estudar e ponto. A gente também aprende trabalhando. É o princípio educativo: quando a escola considera a experiência de quem trabalha, ela vai levar em conta a questão do tempo, que é diferente nesses casos", avalia Edla. A pesquisadora cita um exemplo simples da percepção do tempo para alunos trabalhadores: Se eu tenho o trabalhador que chega na sala de aula às 19h30min sem comer, eu não posso ser rígida ao ponto de dizer que ele não pode comer. Como eu não vou entender a importância desse aluno poder lanchar antes da aula? A escola precisa pensar formas para acolher esse estudante. São coisas muito simples que podem fazer com que ele seja considerado no seu contexto mais amplo.