RJ tem uma criança ou adolescente vítima de estupro a cada 45 minutos, apontam delegacias

Veículo: Globo.com - BR
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Uma criança ou adolescente é estuprada a cada 45 minutos, no estado do Rio de Janeiro, segundo levantamento obtido com exclusividade pela GloboNews, através da Lei de Acesso à Informação, nas delegacias. Em um ano só a cidade do Rio identificou e acolheu 55 crianças e adolescentes vítimas de abuso.

A maior parte desses crimes é cometida contra crianças e adolescentes de 11 a 14 anos. O aumento da violência sexual sofrida por este grupo quase dobrou nos últimos cinco anos. Houve uma alta de 88,5% no número de casos.

Uma mulher, que teve a identidade preservada, diz que as famílias precisam proteger as crianças que vivem ao redor. Ela foi abusada sexualmente por dois amigos do pai, quando tinha 12 anos.

“Uma criança nunca se afasta de um carinho. Quando vê que ela faz qualquer um movimento, algo aconteceu com essa criança. Falaram que se eu falasse com meu pai e minha mãe, eles iam estuprar minhas irmãs e matar meu pai e minha mãe. Eu contei para a minha tia. Ela chamou minha mãe e ela me bateu e falou para eu não contar para o meu pai”, contou a mulher.

A violência se repetiu por duas semanas. Casos assim chegam quase todos os dias na Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima de Niterói, na Região Metropolitana. Recentemente, os policiais prenderam um homem acusado de estuprar os próprios filhos de 7 e 3 anos de idade.

“A mãe teria flagrado um desses abusos e, ao conversar com os filhos, que tinham medo de relatar os fatos, os abusos para ela e para os parentes próximos, porque eles eram ameaçados pelo autor. De forma que o autor ameaçava matar a mãe e a avó dos filhos se eles revelassem qualquer tipo de conduta dele para os outros. Essa é a forma do abusador. Ele geralmente se utiliza para que o crime não seja revelado às autoridades”, disse o delegado Bruno Cinello, da Dcav de Niterói.

A quantidade de registros de ocorrência de casos de estupros contra crianças e adolescentes nas delegacias do Rio de Janeiro revelam o aumento expressivo desse crime cruel. O levantamento obtido pela GloboNews mostrou que, apenas nos três primeiros meses de 2022, quase mil estupros de menores de idade foram registrados no estado.

Isso significa que a cada 45 minutos uma criança ou adolescente é vítima de abuso sexual.

“Existe um abuso, numa situação, muitas vezes, que pode ser lida como uma questão de afeto, uma questão que, inicialmente, pode ser uma questão carinhosa”, disse a médica de família e comunidade Denise Ornelas.

Abusos em ambiente de confiança

A violência sexual contra crianças e adolescentes é como uma sombra. Só pode ser vista quando se joga luz sobre este crime. Os números mostram que a maioria dos casos acontece dentro da casa da própria vítima. Ou em um ambiente de confiança.

Muitas delas não falam da violência que estão sofrendo e esse é o maior desafio dos investigadores. Por isso, os responsáveis precisam estar atentos ao menor sinal de mudança de comportamento.

Para agilizar a proteção das vítimas, seus parentes e também punir os agressores, o Tribunal de Justiça do RJ criou a primeira Vara Especializada em Crimes contra a Criança e o Adolescente.

“Antigamente, os processos eram todos julgados em qualquer vara criminal. E quando a criança for vítima, elas vão ser centralizadas nessa vara. E deságua esse apoio num julgamento mais célere”, disse desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira.

A violência e falta de apoio sofrida pela mulher – estuprada aos 12 anos – deixaram marcas que ainda não cicatrizaram. Os traumas a levaram para as drogas. Atualmente, ela se recupera em um abrigo municipal e sonha com o dia em que a família vai recebê-la novamente.

“Queria sair com eles todos aí na frente me esperando, ser outra pessoa”, disse a mulher.

A médica Denise Ornelas destaca que danos causados às vítimas podem impactar aprendizado e relações emocionais no futuro.

“E são danos que têm uma natureza psicológica que vão impactar na vida imediata das crianças, na questão do aprendizado, do desenvolvimento, das relações emocionais quanto no futuro, qualidade da saúde sexual, saúde reprodutiva. Ela não vai esquecer, mas ela vai saber lidar com isso”, disse a médica.

E por esse ser um crime praticado contra a criança e o adolescente, a lei exige o dever de todos na denúncia. Em especial do responsável legal pelo menor. Ou seja, a mãe, o avô, a tia, quem tomar conhecimento legal do fato e não fizer a denúncia para proteger o agressor, responde pelo crime e também por omissão.